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O Ponto Firme deve ser a melhor coisa do SPFW (mas tem outras coisas boas)

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Tá rolando o SPFW N… Número qual? Ele está sendo chamado de SPFW 25 anos (sim, o evento faz 25 anos, que loucura!) e vai até esse domingo, 8/11/20. É uma edição bem, digamos, instigante, pois é totalmente virtual. Mas eu vou falar mais disso em um post mais pra frente: o que me interessa agora é falar do Ponto Firme, esse projeto lindo que já me emocionou muito em 2018 (aqui está o texto que escrevi na época, no site da Lilian Pacce) e volta a me emocionar agora.

Primeiro de tudo, o projeto ter continuado já é uma vitória por si só. Desde o começo, ele é mais que apenas criação de roupa em crochê: a partir de aulas realizadas em uma penitenciária com presos, o Ponto Firme dá a oportunidade de um novo começo para essa população que sofre preconceito. Não me cabe aqui fazer uma crítica superaprofundada sobre o sistema carcerário, que no lugar de privilegiar a reinserção parece ter fins apenas punitivos que acabam servindo de mecanismo para uma indesejada reincidência no crime. O fato é que o aprendizado do crochê dá diversas coisas para quem faz parte das aulas:

. Uma possibilidade de renda;
. Uma nova perspectiva não só do ponto de vista financeiro mas de criação (no trabalho da subjetividade e na autoestima em se ver como agente criador);
. Uma atividade terapêutica.
E provavelmente tantas outras que não identifiquei de pronto.

A turma que criou o primeiro desfile do SPFW, apresentado em 2018

Estou escrevendo esse texto por dois motivos. O primeiro:

O documentário O Ponto Firme, sobre a criação da coleção de 2018, a primeira apresentada no SPFW, está disponível pra você assistir DE GRAÇA mas é por pouco tempo – então corre nesse link e arrasa!
É um filme dirigido pela Laura Artigas. Sou suspeitíssimo porque sou amigo da Laura, mas ao mesmo tempo pode confiar porque não tenho pudor nenhum com meus amigos – quando não gosto de algo que eles fazem eu simplesmente ME CALO (pode perguntar pra eles kkkkkk).
Emocionei tudo de novo vendo esse doc (só vi ontem, por isso estou no calor do momento). Poderia ficar aqui gastando o meu latim, mas ele em si é muito mais poético que qualquer coisa que eu escreva. Só vou deixar umas frases que pincei dele e que me tocam demais:

A língua é diferenciada mas o ponto é universal.

Por mais que o corpo esteja aprisionado, a minha mente é livre pra ir nos mais diversos lugares, onde eu permita que ela vá.

A moda precisa ser usada pra comunicar coisas importantes.


Obrigado a todos os envolvidos por me devolver aquela emoção de falar de moda. Ver a expressão de alguém que não é ouvido, que a sociedade preferiria ignorar preso numa cela, e ver isso através da roupa… é muito impactante. É muito transformador.

E a apresentação da terceira coleção do Ponto Firme, que rolou hoje no SPFW?

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Em 2020, as aulas do projeto foram interrompidas por causa da pandemia (aliás, a situação da população carcerária não está fácil – leia mais nesse artigo aqui).
A suspensão das aulas foi ruim por um lado, óbvio, mas por outro trouxe um plot twist: alunos que cumpriram a pena e foram soltos (a saber: Anderson Figueiredo, Anderson Joaquim e Thiago Araújo) participaram ativamente da construção da coleção com Gustavo Silvestre, o professor, e essas peças agora poderão ser vendidas! Antes, por questões de trâmites legais complicados, o desfile era só pra apresentar o trabalho deles nas aulas e não tinha como ser comercializado. Agora, como não envolveu a população carcerária, ele chega nas araras da NK Store de SP.

Outra novidade é a introdução do upcycling: peças antigas da marca própria da NK receberam intervenções em crochê. Isso já dá outra cara para o trabalho do Ponto Firme em si, que antes partia das sugestões dos presos. Ao meu ver, as anteriores eram mais interessantes no sentido de ser uma expressão de um grupo que não estava sendo ouvido e que servia de contraponto para as roupas feitas pela elite e para a elite nos desfiles. Ao mesmo tempo, com essa possibilidade de venda na NK, o resultado, que é lindíssimo, me parece mais adequado numa lógica de "ofereça o que elas vão querer vestir".

E é lindíssimo de verdade, vestidos etéreos, de sonho. A direção artística de Karlla Girotto ainda faz um fan service: coloca as peças penduradas em balões. Quem acompanha o trabalho da Karlla e é das antigas lembra daquela imagem poética no Ibirapuera das roupas penduradas em balões em um SPFW de 2006.

Belo demais.

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