A criança que ainda existe dentro de mim está em festa: você viu o catálogo da Amazon Prime Video?!

Sim.
SIM.
SIIIIIIIM.

As tardes da Manchete voltaram. É como se nada tivesse mudado.
Changeman, Flashman, Jiraya e Jiban agora fazem parte do catálogo da Amazon Prime Video e eu estou tão feliz quanto vocês ficaram quando coisas bobas como Friends e Glee entram no catálogo da Netflix.
<3

Não sei muito bem qual é a faixa etária que acompanha esse bloguinho então me sinto obrigado a explicar o que raios é tudo isso.

"Vamos explicar para os novinhos, gente!"

"Vamos explicar para os novinhos, gente!"

Primeira lição: tokusatsu é um gênero japonês que se conecta a efeitos especiais. Tudo que tem efeito especial pode ser considerado tokusatsu. Godzilla, por exemplo, é um tipo de tokusatsu: chama-se kaiju, de monstros gigantes (lembra quando eu contei das trilhas do Godzilla?). Kaiju é tão influente e faz tanto sucesso no Japão que acabou virando um mote de séries de outros gêneros - os heróis derrotam o vilão, ele de alguma maneira cresce (gyodaaaai), e aí os heróis precisam de um mecha (outro gênero do tokusatsu, significa robô gigante, te falei disso nesse post aqui sobre a Hello Kitty) para derrotâ-lo.

Falamos então de kaiju e de mecha. Mas existem gêneros específicos e mais infantis (para dizer a verdade, cada vez mais infantis) que passam na TV japonesa, séries de anos e anos. São eles: Kamen Rider (de onde vem o nosso Black Kamen Rider, que lá no Japão era Kamen Rider Black), Super Sentai (inclui Changeman, Flashman - daqui a pouco falo mais detalhadamente) e Metal Hero (em sua maioria heróis relacionados a serviços políticos ou militares, com armadura de metal, às vezes ciborgues ou andróides - incluindo Jiban e Jaspion; Jiraya é uma exceção, metal hero porém ninja e com armadura com menos aparência de rigidez).
As séries Metal Hero não existem mais - começaram em 1982 com Gavan e terminaram em 1998.
Kamen Rider continua sendo produzido até hoje - e começou em 1971!

Breve parêntese: você sabia que um filme do Jaspion está em pré-produção?
Pois é, o metal hero mais querido do Brasil (e que na verdade nem fez tanto sucesso no Japão) vai ganhar longa metragem feito pela Sato Company. Isso mesmo - apesar do nome, a Sato Company é brasileira! A produção é brasileira! E eu espero que essa bagunça com a Ancine não atrapalhe todos os nossos planos.

Voltando do parêntese: eu diria que sou um fã de nível médio porque tem gente muito, mas muito mais fanática que eu, que assiste as séries novas, acompanha tudo. Ao mesmo tempo, sou fã a ponto de ir no museu da Toei Studios

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Só de lembrar cai uma lágrima.

A Toei é quem produz esses tokusatsus infantis.

“Olha lá, agora ele vai começar a explicar o que é Super Sentai!"

“Olha lá, agora ele vai começar a explicar o que é Super Sentai!"

Tem Super Sentai novo todo ano (assim como tem Kamen Rider e tinha Metal Hero). Isso movimenta o mercado de licenciamento e mantém as crianças ligadonas, já que essas séries têm décadas de existência.
O Super Sentai geralmente é formado por 5 heróis (mas as variações têm sido tantas nesses últimos tempos que essa regra caiu); eles vestem uniformes parecidos onde o que muda são as cores e detalhes, e geralmente trazem temáticas: animais mitológicos, piratas, elementos da natureza, ninjas, veículos de transporte… e até dinossauros. Hum. Lembrou de uma coisa, né?

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Sim, os Power Rangers usavam imagens de Super Sentai e costuravam com outras produzidas nos EUA e com atores americanos. É por isso que todo ano o uniforme deles muda. No Japão, muda tudo: personagens, história, vilões. Às vezes as coisas conversam, tipo um Super Sentai no qual os principais podiam se transformar em heróis dos Super Sentai do passado - é o Gokaiger.

Eu AMO Gokaiger.

Mas vamos falar de Changeman e Flashman? As duas passaram uma seguida da outra na finada Rede Manchete. Changeman começou a ser transmitida no Japão em 1985. Por aqui, depois da primeira exibição em 1988, ficou reprisando ano após ano durante muito tempo. Flashman rolou na TV japonesa em 1986 e chegou aqui em 1989 - reprisando do mesmo jeito. Eu prefiria Changeman, mais clássico e achava mais carismático.

E tinha AHAMES, que PISA DEMAIS na Rita Repulsa.

Se você não está CHORANDO nesses looks é porque sua sensibilidade estética precisa de revisão.

Ahames era diva e eu posso provar com esse vídeo que assisto pelo menos uma vez ao ano.

O Sr. Bazoo era mesmo um insensível - quem não ouviria esse apelo maravilhoso?
Essa cena está na temporada 2, capítulo 26, A Vingança de Ahames - não sei porque raios a Amazon Prime Video dividiu Changeman em duas temporadas porque isso nunca existiu originalmente mas taí.

Sem contar a personagem Shima, que era uma mulher com voz de homem.

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Chiquérrima

Shima tinha uma voz grossa que simbolizava o mal que a dominava; quando ela fica boazinha sua voz vira feminina!

No fundo acho que eu gostava tanto dos vilões quanto gostava dos heróis de Changeman! Aqui, da esquerda para direita, Buba, Giluke e Shima

No fundo acho que eu gostava tanto dos vilões quanto gostava dos heróis de Changeman! Aqui, da esquerda para direita, Buba, Giluke e Shima

E dos heróis? Gostava também. Inclusive sem uniforme!

Anos 1980 só que minimalista!

Anos 1980 só que minimalista!

"Mas Wakabara, você queria ser a Change Mermaid? Você queria ser a Change Fênix? A Ahames? A Shima??"

Nada disso. Eu queria ser a NANA.

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Não essa

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Essa aqui

A Nana é uma alienígena que chega na Terra garotinha. E linda. Olha esse cabelo!

Nana é tudo, parece uma integrante asiática da Turma do Balão Mágico

Nana é tudo, parece uma integrante asiática da Turma do Balão Mágico

Os vilões a enganam por um tempo e o Changeman consegue libertá-la. Ela decide ficar na Terra para aprender mais sobre o lugar e é adotada por uma família terrestre. Só que a espécie dela tem uma vida enquanto criança muito rapidinha - ela então vira uma adolescente de uma hora para outra!

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E é uma adolescente superestilosa

Com isso me pergunto: quem não queria ser a Nana?!
Ai ai, dá licença que eu vou rever Changeman agora mesmo!

Um salve para o cara que criou a trilha clássica de Godzilla

Esse blog é muito cheio dos assuntos nipônicos, né? Que estranho, parece que está no DNA…

Japão brilha!

Japão brilha!

Mas enfim - Godzilla 2: Rei dos Monstros estreou. Particularmente amo esse gênero dos kaiju - que é o nome que se dá para as obras de ficção que trazem monstros gigantes como foco, Godzilla incluso. No Japão se fala Godjira - dá para perceber quando o personagem Serizawa se refere a ele. E nesse universo da Legendary Pictures, no lugar de kaiju, eles falam MUTO (Massive Unidentified Terrestrial Organism).
Resumindo: para quem ama ou ao menos simpatiza com kaiju, o filme é mara, com efeitos especiais incríveis, cenas de ação fantásticas pipipipopopó. Quem não acha tão legal e quer apenas um filme para entreter, procure outra coisa porque esse foca bastante nos monstros gigantes em si (sim, tem mais além do Godzilla, e o Kong do filme de 2017 está incluído nessa turma apesar de aparecer apenas de relance dessa vez). 

De umas belezas belíssimas: King Ghidorah e Godjira em ação!

De umas belezas belíssimas: King Ghidorah e Godjira em ação!

E eu entendo quem não curte tanto. A estrutura é sempre a mesma: algo desperta um monstro que estava nas profundezas, esse monstro destrói cidade (ou cidades, no plural), às vezes aparece um outro monstro que briga com ele, geralmente a intervenção dos humanos nessa briga não dá em nada e eles posam de meros espectadores-narradores, talvez algum monstro vença, em certo momento ele ou eles entram em estado de descanso e a harmonia volta - mas a ameaça continua pairando no ar. A fórmula traz uma variação ou outra mas, no fim, pode ser resumida assim. O bom de assistir kaiju, assim como os tokusatsus em geral (que são as tramas japoneses com efeitos especiais, Jaspion e Changeman inclusos) é que a fórmula te deixa com uma sensação que você tem um certo controle sobre aquela obra, e o ato de assisti-la é como encontrar um amigo querido que você já sabe como funciona…
Que analogia horrorosa!

Uma coisa muito legal desse longa hollywoodiano novo (não lembro se o primeiro dessa série, de 2014, tinha) é a música clássica do Godzilla. Quando fui na Universal em Osaka, tinha uma atração do Godzilla tipo cinema XD - um curta que fazia a poltrona mexer, a água espirrar, o fogo esquentar, todo um babado que deixou o meu marido enjoado por cerca do resto da viagem inteira. Ouvir a música tema já fazia seu coração acelerar, sabe?
Para quem não conhece:

O autor desse tema já morreu: seu nome era Akira Ifukube. Ele compôs esse tema lá em 1954.
Ifukube tem uma história muito interessante: nascido em Hokkaido, a parte norte do Japão, ele teve convivência com os ainus, o povo nativo dessa região (que inclusive sofre muito preconceito até hoje da parte dos japoneses). Analisando a parte genética, dizem que os ainus se aproximam muito mais dos mongóis do que dos japoneses. Sendo assim, Ifukube entrou em contato com uma cultura bem diferente da japonesa muito cedo, e isso o influenciou bastante.
Ifukube faz parte da história de Godzilla - compôs a trilha do primeiro filme da Toho (o estúdio de cinema japonês) e seguiu fazendo outras nas sequências. Foram 8 filmes com o Godzilla na era Showa (1926-1989), fora outros de kaiju como Rodan e Atragon.

Anaconda who?

Anaconda who?

Lá pelo fim dos anos 1970, Ifukube saiu da indústria cinematográfica que lhe deu tantos louros. Ele também gostava muito do universo da música clássica e da academia, e por isso acabou se dedicando a eles nesse período.
Filmes do Godzilla voltaram a ser produzidos em 1984, sem Ifukube, e apesar de um pouco antes da era Heisei (1989-2019), já são considerados dessa “nova fase”. Em 1989, com autorização, eles pegam o tema de Ifukube para o monstro - só que o adaptam de maneira muito pop, o que deixa o compositor, digamos, um pouco incomodado. Aí, quando a Toho bate na porta de Ifukube-san novamente, ele decide sair da aposentadoria para fazer novas trilhas de Godzilla, sempre com a música tema coroando. A última dele, Godzilla vs Destoroyah, é de 1995.
Shin Ifukube morreu aos 91 anos em 2006. Também não viu sua música que virou parte da história do cinema japonês no ótimo Shin Godjira (2016), produção japonesa que correu paralelamente a esses filmes da Legendary Pictures.

Desculpa, Legendary, vocês estão fazendo um trabalho ótimo, mas ninguém mostra Godjira como os próprios japoneses. Ainda mais sem Aaron Taylor-Johnson (para melhorar a fotografia do filme, né?) e Bryan Craston - mas OK, a gente gosta da Millie Bobby Brown. Pela atenção, obrigado!

Ah, e se você, caro leitor, quiser ver algum outro Godzilla após o que está no cinema, sugiro Shin Godjira sem pensar duas vezes!

Um extra antes do fim desse post - vídeo explicativo (em inglês) do IMDb sobre Godzilla, com direito à musiquinha infame das gêmeas da Mothra!