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O Eurovision voltou a captar o espírito do tempo? Ou sempre captou? Ou é apenas uma coincidência?

Tô mais atrasado que o Rubinho Barrichello, mas tá valendo. O Eurovision 2021 aconteceu enquanto eu estava num período sem escrever nesse blog, mas a editoria Eurovision aqui não parou - comentei tudo no Twitter, no calor dos acontecimentos. Mas segui pensando profundamente no evento e tudo que o rodeia desde que ele aconteceu, em maio (juro que não estou sendo irônico).

O Eurovision sempre foi a voz do povo. Agora, olhando com distanciamento, claro que a gente diz: “Ah! Eu tinha certeza que o Måneskin ia ganhar!”. Tinha nada. A gente estava torcendo para a Islândia, para de ser besta!

Mas então o que fez a Itália, na forma do Måneskin, ganhar? A música Zitti e Buoni é um rock que não tem nada de necessariamente novo… para quem é quarentão como eu. Mas será que foi uma geração que não curtiu tanto rock até hoje que votou neles? Ou seja, a Gen Z?
Sinais de que “sim, é isso mesmo” vem na paralela, quando pouco tempo depois a versão roqueira de Beggin’ do Måneskin viralizou no TikTok. O que hoje em dia significa a mesma coisa que estar na trilha da novela das oito na Globo em 1994.

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O Måneskin reproduz ícones bem interessantes. O seu vocalista Damiano David é uma mistura andrógina de Lady Di e rockstar. Os outros integrantes não ficam atrás, todos belos e vestidos de Etro na final do Eurovision em que ganharam. Damiano rasgou a calça sem querer durante a coletiva e causou por causa de um take da transmissão ao vivo, em que parece que ele está cheirando uma carreira de cocaína em cima da mesinha durante a apuração dos votos do evento.

Quando usar uma calça da Etro, cuidado com movimentos bruscos

A versão oficial é que ele não usa drogas (portanto sua nítida empolgação durante a coletiva seria uma mistura de euforia pela vitória e champanhe) e que ele baixou a cabeça naquele tal take para ver um copo que alguém tinha quebrado e estava estatelado no chão. Tem até foto do copo:

Foi feito um exame toxicológico em Damiano que provou que não, ele não cheirou cocaína (teóricos da conspiração, uni-vos e começai a caraminholar, vocês têm o meu apoio). E existe a versão de que ele estava xingando a Destiny, concorrente de Malta, que faz muito sentido quando você revê o vídeo! A dona da teoria é Manuela Barem:

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Para não fazer você dar esse Google, segue a cena:

SIM, FAZ TODO O SENTIDO!!!

Com o desenrolar de 2021, foi ficando claro que o rock de fato está voltando a ocupar algum espaço. Parece que o pop por si só se esgotou, por enquanto. Artistas buscam referências no rock, no country, no eletrônico mais pesado. Aqui no Brasil dizem que até o emo voltou! (E desculpa, mas essa onda eu vou perder, nada contra.)
Então o resultado do Eurovision 2021, que é um concurso no qual o voto popular tem um peso enorme, foi um indicador de caminho para a indústria fonográfica? Ou afirmar isso é um exagero?
Em 2020, não teve Eurovision. Em 2019, quem ganhou o Eurovision foi a Holanda com Duncan Laurence por Arcade, uma balada bonita que fica repetindo “all I know / all I know / loving you is a losing game” (tanto que eu achava que o nome da música era Loving You Is a Losing Game kkkkkkkk). Em 2018, a ganhadora foi Netta, uma maravilhosa sobre a qual já falei aqui, que concorreu por Israel com Toy, um pop com toques de empoderamento feminino. E 2017, não sei se você lembra mas foi o ano esquisito em que Portugal ganhou pela primeira vez, e com uma música em português! Amar Pelos Dois de Salvador Sobral é linda, mas não me parece ter sido indicadora de nada: o português continuou sendo uma língua exótica para quem não fala, não rolou uma febre de fado ou algo assim (não que eu ache que Amar Pelos Dois é um fado, mas vai que, né?).
O que eu acho é que às vezes o Eurovision prevê coisas ou apresenta coisas que já estão acontecendo. Às vezes não. Depende dos concorrentes, depende de muitos outros fatores. Porém, eu não ignoraria o poder dele de captar o espírito do tempo se eu fosse um executivo de gravadora.

Mas e o Måneskin em si, hein?

Måneskin em nada mais, nada menos que UMA CAMPANHA DA GUCCI

Um dos maiores receios de concorrentes de Eurovision, eu suponho, deve ser virar um one hit wonder.
Só que muita gente conseguiu participar com louvor e ainda assim deixar o passado para trás. Ninguém se refere a Lara Fabian como uma ex-Eurovision (aliás, aqui no Brasil se referem a Lara Fabian como a cantora da música em que Carolina Dieckmann ficou careca). Nem Celine Dion. Nem Julio Iglesias.
Será que o Måneskin vai conseguir fazer isso?
Tudo indica que sim. O próprio som deles já se descola bastante do que você espera de uma “música típica de Eurovision”. O visual também: eles não deixam de ser camp, mas tem um frescor juvenil ali que, com a equipe certa, vai ser trabalhado a ponto de deixá-los mais sofisticados e palatáveis para quem é muito chato e gosta de chamar coisas de brega como se brega fosse pejorativo (e na verdade, vide campanha da Gucci, essa transformação do Måneskin já está acontecendo agora).

Ao mesmo tempo, existe gente que tem orgulho de fazer parte da família Eurovision, o que eu particularmente acho massa demais. É o caso de Dana International, por exemplo, ou de Johnny Logan, o único até hoje que conseguiu ganhar o evento duas vezes.
E também é o caso de… vocês sabem quem.

O ABBA é quase um sinônimo de Eurovision. Ambos maravilhosamente pop camp.
Fun fact: o ABBA está de volta, né, você já deve saber, com músicas novas, um álbum novo para ser lançado e shows com avatares-hologramas (que eles estão chamando de ABBATARS kkkkKKKKK), versões jovens de todos os quatro integrantes captadas com toda uma tecnologia a partir deles velhinhos fazendo os movimentos.
Adorei as duas músicas que já saíram, porém suspeitíssimo pois muito fã.

Agora o fun fact em si: a data de lançamento de novas músicas que podem concorrer no Eurovision 2022 segundo o regulamento era a partir de 1/09/21.
As duas músicas novas do ABBA saíram, juro para você, dia 2/09/21.

E agora???
A verdade é que é improvável que o ABBA concorra pela Suécia. Primeiro porque o país tem o seu próprio esquema de seleção: é via Melodifestivalen, um festival de música local. A final ocorre 12/03 do ano que vem.
É extremamente improvável que o ABBA participe do festival, já que eles não vão participar nem mesmo dos próprios shows porque, enfim, eles são o ABBA e já estão aposentados, não precisam passar por essa coisa de show ao vivo nessas alturas e vão mandar os abbatars (pqp kkkkkk) no lugar.
Também é improvável que as regras do Melodifestivalen e do Eurovision aceitem algo gravado, com hologramas, concorrendo.

MAS dito isso tudo… queríamos ABBA no Eurovision 2022?
Nossa.
Me deixe sonhar!!!

Os abbatars!!

Agora: se o ABBA concorresse e se pensássemos nessa lógica de que o Eurovision capta o espírito do tempo… Eles ganhariam?
Minha resposta é sim, pois:
1. Os votantes do Eurovision esqueceriam qualquer lógica: eles amam o ABBA e se derreteriam por eles.
2. Memória afetiva é uma das tendências mais poderosas do nosso tempo.

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