Conan Osíris é o novo António Variações?

Bom… olha aí embaixo e faz um certo sentido.

Conan Osíris na verdade é Tiago Miranda e se batizou assim em uma homenagem ao protagonista de Mirai Shônen Conan, série de TV do Hayao Miyazaki de antes da fundação do Studio Ghibli, que foi lançada em 1978 e chegou em 1980 em Portugal (9 anos antes de Tiago nascer); mais Osíris, o deus egípcio.
Conan é bem próximo da cena fashion portuguesa: fez a trilha de vários desfiles do ModaLisboa, a princípio em inglês. Elas foram compiladas no EP Silk, de 2014, que é um marco em sua carreira porque contém Amália, sua primeira música em português:

Provavelmente foi a partir daí que começou a relação concreta com o fado - o nome da música já remete à rainha do fado Amália Rodrigues, e a melodia e a letra trazem a melancolia do gênero com novas batidas. Adivinha quem fazia isso antes? António Variações.

Caso você não saiba, Variações é uma antiga obsessão minha sobre a qual já falei por aqui, artista português que morreu precocemente:
1. Recentemente foi lançada uma cinebiografia sobre ele em Portugal que quero muito ver
2. Depois da morte de Variações, já nos anos 2000, uma banda foi formada para gravar canções inéditas que ele tinha deixado

Esteticamente, como já demonstrei acima, Conan também se aproxima de uma visão mais arrojada de imagem de artista. E como ele é da "turma da moda", fica mais fácil.

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Depois do EP Silk, Conan lançou Música, Normal em 2016, mas foi em 2017, com Adoro Bolos, que ele começou a expandir seu público. A música-tema é bem, er, doida:

É aí que eu acho que Conan começa a se separar de maneira bem pontual da poética de Variações: a música é irônica e hedonista, apontando o fato do interlocutor adorar bolos (é isso mesmo) como um baita dum problema. Do meio para o fim ele ainda tem tempo de defender a turma LGBTQ+:
"Pai com pai
Pai com mãe
Mãe com mãe
Que é que interessa
O que interessa é dar amor
Banhinho e não comer à pressa

Nas feridas um beijinho, água fria, uma compressa
Ensinar que o mundo não cessa
Só porque a Tessa abraça a Vanessa"

Para o ouvido brasileiro, a sensação de estar ouvindo algo muito novo se amplifica primeiro porque o sotaque e as construções de frase são bem diferentes, e depois a gente sempre fica se perguntando se devemos levar o que ele diz pelo sentido literal ou ele está usando uma gíria, uma expressão tipicamente portuguesa, uma piada interna que só pode ser entendida com contexto?
Confesso que adoro essa sensação kkkkkkkkkk

Outra música do mesmo álbum é Celulitite, que vem a ser “a mania de achar que tem celulite". Risos! Ela ganhou um clipe não-oficial que já conta com mais de um milhão de visualizações no YouTube:

Acontece que Conan largou seu emprego em um sex shop (é sério, ele trabalhava em um sex shop) e decidiu se inscrever nesse ano no Festival da Canção que rola anualmente em Portugal, uma pré-disputa à vaga portuguesa do Eurovision. Usou a música Telemóveis (que é como os portugueses chamam o celular) e… ganhou.

Telemóveis também carrega toques surreais - cada um pode ter a sua leitura. Para mim ele está com saudades de alguém que já morreu e queria muito poder falar com essa pessoa novamente, mesmo que com um celular. E fica tão frustrado que… quebra o seu telefoninho, vixe.

Eu partia telemóveis
Mas eu nunca mais parto o meu
Eu sei que a saudade tá morta
Quem mandou a flecha fui eu

Conan ficou em 15º no Eurovision de 2019, o que acho um pouco injusto mas também nunca entendi direito o Eurovision e no fundo sempre achei meio cafona. Não que eu não goste de coisa cafona - mas acho que seria esquisito Telemóveis ganhar, mesmo… Rsrsrsrs! Quem ganhou o primeiro lugar foi Replay, uma música de Chipre (!!) da artista Tamta. Ouça:

Ou não ouça - porque é uma BOBAGEM.

Por fim, se você googlar Conan Osíris António Variações, vai ver diversos resultados tentando responder a pergunta do título desse post. O melhor é um em vídeo, onde quem responde é… o próprio Conan:

FAIXA BÔNUS: Conan já citou essa música como “uma das obras mais necessárias". Com vocês, Sr. Extraterrestre de Carlos Paião por Amália Rodrigues: