Tracey Thorn é rainha demais!

Foi um tempinho sem conhecer Everything But the Girl. A dupla, formada por Tracey Thorn e Ben Watt, começou sua carreira em 1982, mas foi só quando eu tinha 15 anos, em 1996, que fui visitar minha irmã Ana Flavia que estava morando em Atlanta e ela tinha comprado o CD Amplified Heart com o megahit Missing (aquele que ganhou um remix bem bate-cabelo).

Foi mais uma das coisas de música que minha irmã me apresentou e amei - uma boa parte do meu gosto musical se construiu pelos discos dela. Tracey tinha uma das vozes mais lindas que eu já havia ouvido - e segue assim até hoje. Ela era muito cool, assim como seu marido Ben. Um pouco depois, em 1996, eles lançariam o eletrônico Walking Wounded - o ano em que fui para Londres pela primeira vez, então imagina como amei, né? No mesmo 1996, era lançado o Red Hot + Rio, álbum coletivo cuja renda ajudava na conscientização sobre a AIDS, nessa época ainda uma doença muito misteriosa - a lista de músicos incluía Marisa Monte com David Byrne, Crystal Waters cantando The Boy from Ipanema em versão house, Caetano Veloso com Cesária Évora e Ryuichi Sakamoto, Chico Science e Nação Zumbi em versão remix, Cazuza e Bebel Gilberto numa versão demo bem caseira e linda de Preciso dizer que te amo.

Eu me apaixonei perdidamente por esse disco, ouvia pencas, ele era tudo que mais amava. A segunda faixa era Corcovado com o Everything but the Girl, Tracey tentando imitar o sotaque de João Gilberto, batidas que críticos odiaram por tirar toda a bossa da bossa nova - mas era essa a nova bossa, era estranho e muito atraente para mim. Cantava junto imitando o sotaque da Tracey Thorn, meio ridículo, meio intrigante, meio charmoso, meio irresistível.

A verdade é que qualquer coisa que Tracey fizesse a partir daquele Amplified Heart eu provavelmente comeria de garfo e faca e lamberia os beiços. Como Protection, a música na qual ela escreveu letra e melodia com o Massive Attack.

O tempo passou e eu aprendi a amar toda a discografia do Everything but the Girl. E fissurei até na banda que Tracey teve antes, a obscura Marine Girls, que virou moda entre os indies porque tinha um fã bem famoso: Kurt Cobain.

Depois o Everything but the Girl acabou e Tracey se dedicou a uma carreira solo (que também adoro). Mas eu queria chegar em outro lado dela: o de escritora.

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Ela começou com uma biografia

Mas deu tão certo que virou colunista da revista New Statesman

De lá para cá, além do Bedsit Disco Queen, Tracey lançou mais dois livros. Esse post inteiro é mais para falar do segundo, Naked at the Albert Hall, no qual ela fala sobre o cantar e cantores.

Tracey escreve muito bem, tem aquele humorzinho ácido inglês e ao mesmo tempo se aprofunda nos assuntos de uma maneira que gosto muito, com pesquisa, citando diversas fontes - incluindo livros de ficção que possuem personagem cantores. As discussões que ela levanta são muito interessantes: por que a gente acha que a letra que o cantor canta sempre tem um caráter pessoal? Por que a gente sente um tipo de intimidade doida com cantores que geralmente não acontece com outros tipos de artista? Por que o fã pode ser um negócio maluco e obsessivo? Como é que o cantor encontra uma voz e um jeito de cantar e geralmente não consegue mudar depois, quando já tem uma carreira consolidada?

Explaining how you wrote a song, or what it’s about, it reminds me a bit of that Robert Frost quote, when he was asked to explain what a poem meant and he said, ‘What d’you want me to do? Say it again in worser English?’
— Tracey Thorn entrevistando Romy Madley Croft do The XX em "Naked at the Albert Hall"
Tracey é uma pessoa que pensa nas coisas que canta e que escreve - isso me atrai! Fonte da foto: Rolling Stones, o artigo que fala sobre o último álbum que a Tracey lançou, Record

Tracey é uma pessoa que pensa nas coisas que canta e que escreve - isso me atrai! Fonte da foto: Rolling Stones, o artigo que fala sobre o último álbum que a Tracey lançou, Record

Para terminar, ressalto os ótimos dois refrões de Dancefloor, música do último disco de Tracey.

Oh but where i’d like to be
is on a dancefloor with some drinks inside of me
Someone whispering it’s quarter after 3
There’s no where I’d rather be
(...)
Oh but where i’d like to be
is on a dancefloor with my friends all pissed at me
Someone singing and I realise it’s me
I realise it’s me
— Tracey Thorn em "Dancefloor"