Já que vocês amam os anos 1980, ouçam essa música solo do Freddie Mercury

Não é uma música inédita, mas é tipo uma pérola ignorada na época: Love Kills foi lançada em 1984 para a trilha da versão remasterizada e reeditada do clássico Metrópolis de Fritz Lang. Tem uma clima bem Studio 54 (que na época já não estava mais na sua era áurea), é o primeiro single solo de Freddie Mercury e conta com o mestre Giorgio Moroder como co-autor (aquele que a gente comentou bastante no post sobre Donna Summer). Dizem que originalmente a música foi feita pelo cantor para o 11º álbum do Queen, The Works, lançado também em 1984, mas acabou de fora dele. Ela funcionaria ao lado de Radio Ga Ga e I Want to Break Free? Ouça e chegue nas suas próprias conclusões:

Esse novo mix e o lyric vídeo acima faz parte da promoção de um box que está sendo lançado só agora na esteira do sucesso do filme Bohemian Rhapsody chamado Never Boring. São 3 CDs com 32 faixas, um blu-ray e um DVD com vídeos promo e entrevista, um livro de fotos de 120 páginas e capa dura, texto do Rami Malek (que ganhou o Oscar por sua performance como Mercury em 2019).

Não é a primeira vez que essa faixa é retrabalhada e relançada. A compilação de 2014 Queen Forever trouxe uma versão meio balada com os integrantes originais do Queen tocando seus instrumentos.

E mais: tem uma versão da divertida Little Boots, bem dançantchi!

Feels like 2009? É porque a versão é de 2009 mesmo! Entrou só em versões deluxe de álbuns dela.

E Metrópolis todo mundo sabe o que é, espero, né?

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Clássico de 1927, moderno até hoje, com um visual absolutamente inspirador. Não gosta de filme mudo? Assista mesmo assim. Não gosta de ficção científica? Azar o seu, assista mesmo assim. Não gosta de expressionismo alemão? Tô nem aí: assista. Todas as referências, tudo o que ele gerou, tudo o que ele ainda vai gerar - referência mor. Não tem como escapar dele. Assiste logo e já tira da frente!

Voltando para o começo do post: em 1984, uma versão de 83 minutos (a original tem 153) foi lançada. Era obra de Moroder em si, que disputou os direitos com David Bowie (!) e ganhou (!!). Ela foi colorizada, recebeu novos efeitos especiais, ganhou legendas no lugar daquelas cartelas de texto típicas do cinema mudo e contou com toda uma trilha sonora que incluía essa canção de Freddie Mercury mais coisas de Bonnie Tyler, Adam Ant e outros. Mas parece que a crítica especializada preferia que Moroder seguisse a carreira musical, mesmo: a versão foi mal-recebida e concorreu ao Raspberry Awards (o Oscar dos piores) por música original (a Love Kills em si!) e trilha sonora.
Bom, na época em que a versão original de Metrópolis foi lançada, muita gente falou mal dela. Os críticos do New York Times e da New Yorker, por exemplo. Hoje a versão de Moroder tem um status cult, não tão respeitado quanto a obra prima de Fritz Lang mas desperta uma curiosidade.

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Em tempo, o visual de Metrópolis inspirou coisas tão díspares quanto o clipe de Express Yourself da Madonna, Blade Runner de Ridley Scott e o mangá homônimo de Osamu Tezuka que, apesar de ter paralelos com a história original, não é uma simples adaptação e sim uma outra história!
Na dúvida, assista tudo!

Então quer dizer que o santropeito vai voltar mesmo, Harry Styles?

Todo mundo falando do surubão do clipe novo do Harry Styles mas eu só fiquei de olho nisso:

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Sim, uma calça de cintura alta no boy!
Deve ser Gucci porque eles estão num casamento feliz, né?
Não é a primeira vez que Harry adere à calça santropeito. No baile do Met de 2019, por exemplo:

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E transparência

Tá, bebê?

Dentro do baile ele mudou de roupa para essa aqui

Dentro do baile ele mudou de roupa para essa aqui

E segura que tem mais:

Para quem fez da sua marca calças skinny de cintura baixa até pouco tempo atrás, me parece que, enfim, o jogo virou.

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Oh, sweet creature

Cê acha?

Outra coisa que eu queria mostrar é esse tweet do meu amigo Daniel Beoni:

E o seu #larry, está vivo?

Assista Lights Up aqui:

Alguém faz a biografia da Angela Ro Ro, por favor

Angela é absolutamente tudo na vida.

Tipo aos 30 anos, em 1979, Angela lançou seu álbum de estreia homônimo que é uma joia maravilhosa - gosto de todas as músicas.

E existe sim, a história da Zizi Possi, que acusou Angela de agressão física. Só que existe a história. É verdade? Dizem também que Angela queria uma reconciliação e que faria uma turnê com a ex chamada A Paz, na qual uma cantaria o repertório da outra… No caso de Angela, não dá para saber se ela está falando sério ou tirando uma. É sério! Olha esse vídeo!
Você já assistiu uma entrevista com Angela? Recomendo. Assistir shows também.

No programa O Som do Vinil sobre o disco Escândalo (1981), que é da época da separação com Zizi e do interesse dos tabloides pela sua vida pessoal mais do que pelo seu trabalho, ela fala de maneira tangencial sobre o caso. Tem um recorte muito revelador no meio do vídeo, que deixo também abaixo para você ver melhor.

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Tem mais esse recorte, na revista Manchete de 1981:

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Angela e Zizi no baile do Pão de Açúcar

Em 1980 - dizem que foi nesse baile que as duas começaram um teretetê

Mas elas já se conheciam antes - essa foto saiu na revista Manchete em 1979

Mas elas já se conheciam antes - essa foto saiu na revista Manchete em 1979

Depois de ir parar na DP, Angela ainda teria ido num show de Zizi, Um MInuto Além, e fez um, adivinha… escândalo. O espetáculo não rolou.

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Um breve parêntese bem interessante. Zizi Possi no programa De Frente com Gabi com a filha Luiza Possi, e Marília Gabriela pergunta de bowas sobre o boato que Luiza estaria tendo um caso com Maria Gadú e relacionando-o com a história de Zizi com Angela. É. meu bem… Nada muito bombástico mas achei interessante trazer aqui. Começa no 1 minuto e 55 segundos, mas recomendo a entrevista inteira porque é bem legal:

Enfim: Angela é sempre bem humorada, uma storyteller que admiro porque ela não segue uma linha narrativa careta de começo, meio e fim (teria como a artista seguir algo de maneira careta?) e mesmo assim prende a atenção. Olha essa entrevista no programa Jô 11h30 do SBT, para o Jô Soares:

Aqui, já 2014, no programa do Ronnie Von da Gazeta Todo Seu:

Mais um Som do Vinil com Angela, esse sobre o primeiro disco:

E aqui, maravilhoso: Angela no Clodovil, nos anos 1990 na Manchete:

Mas vamos voltar?
Antes de 1979, ano do lançamento daquele discão que eu coloquei no começo desse post, Angela passou alguns anos na Europa. Primeiro foi para a Itália, onde morava Glauber Rocha. Ela falou para o livro Pavões Misteriosos de André Barcinski: “Ele queria me comer de qualquer jeito, queria ter filhos comigo. Era impressionante, só de ele olhar para mim eu já me sentia grávida."
A cantora também diz que Michelangelo Antonioni (!!) queria que ela atuasse em um filme, que ia pagar para consertar o dente da frente quebrado da Angela. Ela ficou de saco cheio e disse "Che noia, Michelangelo!
Imagina se tivesse rolado? Será que a gente teria aquele mesmo disco de 1979?

Em Londres, Angela ainda disse que Malcolm McLaren queria que ela gravasse um álbum de blues mas o projeto não vingou. Em 1975, um pouco depois disso, saía Sex Pistols, a banda que McLaren inventou! Será que a Angela conheceu a Vivienne Westwood, que era a mulher de Malcolm na época? Será que ela teve uma brusinha original Vivienne Westwood e, sem dar bola, jogou fora?
E tem a primeira gravação com Ro Ro, que não foi esse tal álbum do qual eu não paro de falar (porque é muito boooom). Em 1972, ela apareceu tocando gaita para a faixa Nostalgia (That's What Rock 'n’Roll is All About) do Transa de Caetano Veloso - Caetano estava no exílio, ainda em Londres. Que tal?

Portanto, repetindo: alguém faz a biografia da Angela Ro Ro, por favor.

A canção de protesto portuguesa contra a energia nuclear

Quem acompanha o blog já deve ter reparado que estou com certa fixação pelo pop português (aqui, aqui, aqui, aqui). E também pode ser que saiba que eu já fui para Chernobil, antes da série da HBO, para ver de perto as consequências de uma tragédia envolvendo energia nuclear.
Então esse post vai unir ambas as coisas via Lena d'Água, cantora portuguesa que é filha de um jogador de futebol bem famoso chamado José Águas que foi do Sport Lisboa e do Benfica.
Em 1982, no seu álbum Perto de Ti, a primeira faixa é essa:

Pelo que entendi, a música foi uma reação a uma tentativa de instalação de uma usina nuclear em alguma região de Portugal. O acidente de Chernobil só aconteceria em 1986.

A música diz coisas como:
Nuclear não, obrigado
Antes ser activo hoje
do que radioactivo amanhã
Nuclear não, obrigado

Se queremos energia
sem envenenar o ar
Temos o calor do sol
o vento e a força do mar


Isso me faz lembrar que os ucranianos, ou pelo menos a guia que era responsável pelo tour que fiz em Chernobil, garantia que a energia nuclear era uma energia limpa e segura, mesmo com toda a história do acidente nuclear. Como se a tragédia tivesse sido um fato isolado, e que reatores nucleares continuam sendo a melhor solução.
Oh, well…
No Brasil, sou um defensor (não tão vocal e ativista, mas sou) da energia eólica e solar, coisas que o país tem de sobra; e acho que precisamos-devemos investir mais nessas tecnologias.

Bom, Lena é uma personagem superinteressante, então vou falar um pouco mais sobre ela nesse post, com licença!

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Do mesmo jeito que tivemos, no Brasil, a desbravadora Rita Lee, mulher à frente de banda de rock, Portugal teve Lena. Do fim dos anos 1970 para toda a década de 1980, Lena teve uma constante presença na cena da música popular portuguesa. Nos anos 1990, ela partiria para um caminho mais, digamos, mainstream? E talvez menos autoral, pelo menos na minha visão de quem acabou de conhecer o trabalho dela.
Lena tem uma ligação forte com duas cantoras: Billie Holiday e a brasileira Elis Regina. Já fez espetáculos baseados no repertório de ambas. Mas sabe qual outro artista também bate forte na cantora?
Sim, claro: António Variações.

A sua versão é mais pop que a versão original, e apesar do vídeo ser datado em 1994, Lena lançou a sua versão da música em 1987, no álbum Aguaceiro.
Outras que ela também canta, compostas por Variações, são Tu Aqui (que dá nome ao disco de 1989) e Adeus que me Vou Embora (do repertório do mesmo Tu Aqui). O vídeo abaixo foi gravado na Bósnia (?!) para soldados portugueses que estavam lá.

Em 2019, no mês de maio, Lena voltou à cena com álbum de inéditas. Antes, em 2014, fez o Carrossel no qual regravou músicas da sua carreira com um power trio de rock. Aliás, em Carrossel ela regravou Nuclear Não Obrigado! Em 2005, saiu um ao vivo também de regravações. Na prática, se a gente não contar 1992 e o álbum voltado para o público infantil Ou Isto Ou Aquilo, com poemas de Cecília Meireles musicados, não existia disco de inéditas de Lena desde… 1989, com o Tu Aqui! 30 anos!!!
Então o Desalmadamente é bem importante, mesmo.

O mais interessante: a voz de Lena segue poderosa, mesmo após um vício em heroína (que é confesso por ela própria como um dos seus maiores arrependimentos). As músicas são todas de Pedro da Silva Martins, o mesmo compositor por trás de Deolinda (já ouviu Parva que Sou, do Deolinda? Se sim, pois é, é dele! Se não, deveria ouvir! Segue um hino!). Resumo: CV o Desalmadamente tem!

Dê o play, é divertido, é uma letra boa, tem os modernos de Portugal no clipe, eu amei.

"Espero que te caia a boca ao chão
Q'eu estou pronta para a grande festa
e tu de charuto e roupão
com um arpão espetado na testa”

Tudo! Para finalizar, uma Lena das antigas, maravilhosa:

A freira que cantava - e que vendeu pencas, e que morreu infeliz

Você deve saber. Você já ouviu. Não tem como: é um dos maiores hits da década de 1960 e chegou ao topo da parada da Billboard.

A Soeur Sourire (algo como Irmã Sorriso), também conhecida como Jeannine Deckers e como The Singing Nun (a freira cantora), era belga e era freira mesmo, da Ordem Dominicana. Quando entrou no convento, ela cantava para as colegas e para visitantes, de maneira casual - e foi encorajada a gravar um disco que seria vendido no próprio convento. Acontece que o álbum foi gravado e lançado pela Philips da Bélgica e, surpresa, se transformou na primeira e até agora única canção belga a alcançar o topo da parada americana.
Mas Jeannine era antes de mais nada freira. E virou one hit wonder: seu segundo álbum não vendeu quase nada, a maior parte do dinheiro ficou com a Philips e sua congregação. Não se sabe exatamente quais foram os termos do desentendimento, mas em 1966 Jeannine saiu do convento. E aí a coisa começou a descambar, com a agora ex-freira (mas ainda católica, apesar de suas críticas à igreja) proibida de usar o nome Soeur Sourire. Sob o novo apelido Luc Dominique, ela gravou uma música em 1967 defendendo… o uso da pílula anticoncepcional. Avançada, não? Abaixo, a versão em francês:

Antes disso, Jeannine viu a sua vida romantizada em um filme em 1966 com Debbie Reynolds. Ela o rejeitou.

Aí teve mais umas tentativas de repetir o sucesso de Dominique, todas falhas. Inclusive uma que infelizmente não achei registro, a música Sister Smile is Dead. É, Jeannine Deckers no fundo era bem rock 'n’ roll.
Um colapso nervoso e dois anos de terapia se seguiram. Em 1973, envolvida com o movimento da Renovação Carismática (que é o mesmo movimento que, por exemplo, adora o Padre Marcelo Rossi), ela própria se viu renovada. Mas o pequeno sucesso foi momentâneo: o governo cobrou impostos atrasados, Jeannine se viu em sérias dificuldades financeiras. Em 1985, ela e sua companheira da vida inteira Annie Pécher tomaram uma overdose de barbitúricos e álcool e morreram.

Sobre Annie, aliás, existem duas versões. A da própria Jeannine era essa:

People at my record company think that two women who live together must be lesbians. They assert even that nuns in convents are in love. I deny these rumors as I testify against every creepy spirit. The answer is still obvious that I am not homosexual. I am loyal and faithful to Annie, but that is a whole other love in the Lord. Anyone who cannot understand this can go to the devil!
— Jeannine Deckers sobre Annie Pécher e os boatos de uma relação homossexual

Creepy shit, irmã?!

Catherine Sauvat
, que é uma das biógrafas de Jeannine, diz que na verdade, após anos vivendo juntas, as amigas viveram um relacionamento sexual sim.
Teve uma outra cinebiografia em 2009:

E me lembro vagamente de ter assistido um filme muito doido em uma Mostra Internacional de Cinema de SP que era a história de uma freira que cantava essa música, mas que não me parece ser esse do trailer. Será que é? Tentei achar outro sem sucesso. Se alguém souber me dá um toque.

No Brasil, a cantora Giane alcançou certo sucesso com a versão em português de Dominique em 1964. Foi uma das primeiras cantoras do Brasil, ao que consta, a fazer overdub - uma segunda voz para si mesma em uma canção.

Os novinhos conhecem a música principalmente por causa de American Horror Story: Asylum. Lembra? Meda!

Dizem que Jeannine Deckers inspirou jovens a seguir uma vida religiosa no convento, sendo que ela mesma acabou saindo (mas deixou uma carta dizendo que seguia católica e foi enterrada segundo os ritos da religião). O mito da freira cantora com violão prosseguiu desde então, com referências como… essa aqui:

E essa, que vem de um dos únicos títulos de filme mais felizes no Brasil que no original: