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Como pode o Cornélius, né?

November 25, 2021 by Jorge Wakabara in música

Confesso que tem poucas coisas na música que não me atraem, e quando elas ainda não me atraíram, é provável que em algum momento eu enxergue o valor e comece a ouvir mais.
É o caso do hard rock cabeludo brasileiro dos anos 1970 e 1980 (e mesmo as bandas internacionais na mesma pegada). O tropicalismo segue sendo uma das minhas coisas preferidas do mundo; o BRock, em menor intensidade, também. Mas do recheio deles, curto Secos & Molhados (MUITO) e olhe lá.
Porém tem algo crescendo aqui. Uma pessoa, particularmente. E o nome dele é Cornélius.

Chamado Cornélio de Aguiar Neto, Cornélius acabou conhecido como Cornélius Lúcifer quando assumiu os vocais da Made in Brazil, banda longeva daqui, que começou lá em 1969 e, inspirada no glam rock de fora, começou a se maquiar no palco (diga-se de passagem, antes do Secos & Molhados).
Apesar de Cornélius volte e meia ter se apresentado com o Made in Brazil antes de morrer em 2013, só existe um disco da banda com seus vocais: é o disco da banana, de 1974 (é conhecido por esse codinome porque o disco tem uma bananinha estampada na capa).

A voz de Cornélius realmente chama a atenção, bem na escola hard rock, rasgada e com agudos. Ele mesmo já disse que, como os equipamentos eram ruins, gritava e nem sabia se cantava direito porque não se ouvia. A grande maioria das músicas desse primeiro disco é composta por Oswaldo Vecchione, baixista e um dos membros fundadores ao lado do irmão guitarrista Celso Vecchione.

“A gente vive desafiando padrões. Quando a gente não está satisfeito com o padrão vigente, a gente sempre desafia.”
— Cornélius em entrevista para o programa de rádio “Noites Futuristas” em 1988

Aí já chama a atenção uma história muito boa. Diz que Quando a Primavera Chegar, música dos irmãos Celso e Oswaldo que foi gravada no disco seguinte já sem a participação de Cornélius (substituído por Percy Weiss), já era apresentada em shows antes (com Cornélius). Mas a letra não era assim. Em vez de “tomar um sorvete”, ela provocava um pouco mais com “chupar um sorvete”. Ouça a versão já censurada do disco Jack O Estripador de 1976:

Ouviu?
Esse medo, esse receio, esse desejo de chupar (disfarçado aqui em tomar)…
Recado dado, né?

Enquanto o Made in Brazil lançava Jack o Estripador, Cornélius seguiu a vida e deu um tempo do rock com Santa Fé, um álbum solo lançado em 1976 cuja capa ainda trazia uma imagem andrógina. Ele mesmo passou a assinar como Cornélius Santa Fé - dando a impressão que queria deixar o demônio roqueiro para trás, tanto no nome artístico como na música, mais para MPB romântica e para funks nervosos. Ele já declarou em entrevistas posteriores que estava numas de desenvolver a espiritualidade. E uma das canções simplesmente se chama Você Jamais Irá Pro Céu! Ainda assim, rolam uns vocais rasgados, uns solos…

A coisa aqui começa a ficar mais suingada, mais dançante. O soul à Roberto Carlos e Tim Maia contaminou Cornélius, a ponto dele fazer uma música toda em inglês chamada Soul Tramp! É o início de uma mudança grande de carreira, em direção a algo que ainda estava surgindo na época mas que iria estourar.

Fala sério, olha esse look? AFFFF que ícone

E aí, em 1978, a febre disco music chegou. Cornélius foi um dos que entraram de cabeça. Injustamente, depois ele chamou isso de “prostituição”, renegando essa fase de sua carreira.

Eu Perdi Seu Amor virou hit de programa de auditório e tudo. Um dos compositores é Paulinho Camargo e, para mim, Eu Perdi Seu Amor faz parte da trilogia de hits discoteca dele ao lado de A Noite Vai Chegar de Lady Zu e Amor Bandido de Sarah Regina. Todas perfeitas.
Quanto à capa do single, bem, quem vem ao glam não degenera. É como se fosse um desenvolvimento da capa de Santa Fé, o mesmo biquinho, o chapéu pintoso, mas agora com muito brilho!
Acontece que Cornélius não chegou a lançar um disco inteiro de disco music. O que rolou foi um EP, com as mesmas músicas desse single mais Fugindo de Mim (de Paulinho com Dalila Camargo) e Se Você Quiser Transar Comigo (de Hébano).

(Já deu para perceber que Cornélius SERVIA nas capas, né?)

Ainda houve uma última tentativa de emplacar em mais um single no ano seguinte, dessa vez com Paulinho Camargo se unindo ao dream team Lincoln Olivetti e Robson Jorge para compor a música Enquanto Houver Amor. Menos disco, mais funk cheio de groove. E quer saber? É bom demais.

O que aconteceu para não acontecer? A voz era ambígua demais e já bastava um Ney? Não teve investimento de divulgação? Mistérios do pop.

Deixa, a faixa do outro lado desse single de 1979 e de composição de Frankye Arduini (da incrível dupla Tony & Frankye), entrou para a coletânea Disco É Cultura de 2020 da Mad About Records, que há pouco tempo estava no Spotify (e é ÓTIMA) e sumiu. Talvez porque era pirata. Rsrsrsrs!

Cornélius nunca mais teve um registro próprio em disco depois de 1979. Como já disse, ele participava de show da Made in Brazil esporadicamente. Cornélio quis “assassinar” o Cornélius, após se “prostituir” na disco music (e ganhar muito dinheiro com isso, como reconhecia), porém não emplacou uma “nova era” antes de morrer.

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November 25, 2021 /Jorge Wakabara
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música
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Cantoras brasileiras que a gente precisa enaltecer e ouvir

August 16, 2020 by Jorge Wakabara in música

Elas são incríveis e, no entanto, passam longe das páginas de jornalismo cultural – que de qualquer forma já são poucas. Acredito que é nosso dever enaltecer e exaltar essas mulheres que possuem um repertório maravilhoso mas ninguém comenta a respeito. De todas elas, só uma já morreu. Estão por aí, cantando, cheias de talento.
Ah, e elas possuem uma coisa em comum além do fato de serem cantoras: são negras.
Coincidência?

Vamos a elas:

Eliana Pittman

Já estava pensando em fazer esse post quando vi essa postagem da Flávia Durante:

Não vi uma linha sobre os 75 anos de Eliana Pittman na imprensa, alguém viu? Isso porque ela está em plena atividade na TV e na música, lançou disco ano passado e esse ano ao lado de outros dois ícones, Claudette Soares e Doris Monteiro. #etarismonamúsica

— Flávia Durante 🎶 (@flaviadurante) August 15, 2020

Ela tem toda razão.
E sim: Eliana Pittman completou 75 anos por esses dias.

Talvez você não saiba citar mais de três músicas de Eliana. E muita gente não citaria uma – especialmente o pessoal mais novo. Sendo que Eliana tem jazz maravilhosos, tem um repertório chocante de bom. Ela quem mostrou o carimbó para o resto do Brasil primeiro – sim, o carimbó de Belém do Pará que hoje virou modinha entre os universitários vilamadalenísticos…

(E essa maravilha de capa? Aliás, todas as capas que você vai ver nesse post são maravilhosas.)
Sinhá Pureza, que é do Pinduca, ganhou regravação em 2009 da Fernanda Takai.

Eliana começou a carreira com o padrasto, o músico de jazz Booker Pittman. Inclusive, o primeiro registro gravado dela, pela gravadora Mocambo e com orquestra pernambucana, é com ele. O-LHA-ES-SE-JAZZ:

Nessa gravação, Eliana tinha 16 para 17 anos. Sim. Pois é.

Quando Booker ficou doente, a cantora se viu na necessidade de ser o arrimo da casa. Saiu trabalhando. Tem vários discos gravados. É toda uma discografia a se descobrir, com uma qualidade absurda. E ela descascando Summertime nesse álbum abaixo de 1969, para depois seguir com Villa-Lobos em Estrela é Lua Nova? Aí sim! E uns arranjos de chorar de lindos. Nem sei o que dizer.
(Ainda vou ser ousado e dizer: prefiro essa interpretação dela de Se Você Pensa do que a da Elis Regina. Pronto, falei.)

“Sou intérprete. Canto o que acho bonito e canto o que acho que posso cantar.”
— Eliana Pittman em entrevista para Pedro Alexandre Sanches publicada no Farofafá
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Eliana continua produzindo coisas maravilhosas. Ano passado, lançou o disco Hoje, Ontem e Sempre, com base quase nua, praticamente só violão e percussão. Várias músicas conhecidas aparecem, mas são inéditas na voz dela – tipo Onde Estará o Meu Amor do Chico César e… Gamei. Sim, o pagode, aquele do Exaltasamba. Com ela, vira outra coisa (e nada contra pagode, Gamei já é genial no original, só para deixar claro).

Recentemente, a cantora lançou As Divas do Sambalanço ao lado de Dóris Monteiro e Claudette Soares. Ela também faz parte do elenco da segunda temporada de Coisa Mais Linda, série da Netflix.
A voz dela segue maravilhosa (aliás, de todas elas, então já aviso isso logo para não ficar repetindo).

Vale a pena ler essa entrevista de Eliana Pittman no blog Farofafá da Carta Capital – ela fala sobre essa dificuldade em não ser especializada em um estilo musical só e o preconceito que sofre por causa disso.

Sonia Santos

Uma leva de cantoras de samba fez bastante sucesso (e principalmente vendeu muito disco) a partir dos anos 1970, como Alcione, Beth Carvalho e Clara Nunes. Sonia Santos é conterrânea dessa galera, apesar de sua estreia mesmo ter sido com essa pérola aqui:

Porque é de Raul Seixas e Paulo Coelho – foi composta para a trilha sonora da novela O Rebu (1974). Você vai ter que me aturar é de Nei Lopes com Reginaldo Bessa, outro incrível músico e compositor que merecia mais atenção das massas. A ótima Tributo a Cassius Clay, em homenagem ao Muhammad Ali, também é de Bessa – a interpretação de Santos é fina, emocionada e precisa. Marraio é uma surpresa linda e funkeada.

O disco de estreia de Sonia, que levou seu nome e saiu em 1975, já traz uma preferência pelo samba. Mas também conta com chorinho (Brasileirinho num ritmo mais lento, por exemplo, valorizando a melodia sinuosa que é levada por ela numa boa) e até samba rock (Pátria Amada de Jorge Ben). Em Até Breve de Elton Medeiros e Cristóvão Bastos, fica clara a sua afiliação ao clube Elizeth Cardoso de interpretação:

Mas é o disco seguinte que eu me arrebento de amar. Tem Paulinho da Viola (O Filho de um Sambista), Noca da Portela (Afinal Eu Encontrei, com Délcio Carvalho), Mário Lago (Fracasso, um samba-canção bem triste). E ainda tem isso aqui, de autoria da própria Sonia com Ângela Soares:

Chocado que isso não é hit das intérpretes que adoram imitar Elis.
(Tô num momento sincero da vida, como vocês podem perceber).

Sonia acabou mudando para os EUA e construiu uma carreira por lá. Seguiu gravando, inclusive sem se prender só à música brasileira. Adoro Malcolm X (dela com Julinho de Palmares) e Speed, outra de Ben:

Márcia Maria

Ela tem um disco lançado no Brasil. Só unzinho. E basta. Mas sinceramente ele vale por vários:

Até a foto da capa é maravilhosa.
A música Gandaia, de Wando (!!!) com Luis Vagner é um luxo.
E Tambourine? É chique e dançante, envolvida e embrulhada com o timbre maravilhoso de Márcia. Na cozinha, a dupla Robson Jorge e Lincoln Olivetti vão fazendo aquela delícia toda deles.

Destaque, ainda naquele álbum de 1978, para Para Comigo Fazer de Djavan (lenta, meio Bethânia), Pensar de Martinho da Vila e a absurda Amigo Branco de Leci Brandão, que diz coisas do tipo: “Preconceito existe? Eu não sei! Meu amigo branco é de lei!". Ou seja, a música diz que ela, negra, não tem preconceito com o amigo branco dela. Justo! Acho uma inversão irônica, polêmica e, no mínimo, gostosa de balançar.

Márcia seguiu gravando fora do Brasil, presumo. Jazzística, aprontou coisas como Nada Será Como Antes do Milton Nascimento com Ronaldo Bastos e Desafio, que estranhamente parece saída do repertório de Milton mas nem de autoria dele é (achei algo indicando George Paulo e Paiva Marcos como autores).

Ah, e tem isso, de 2005…

Ouvi e disse “ARTISTA".

Marizinha (e Evinha) – que família abençoada

Já falei de Evinha por aqui: ela era do Trio Esperança e saiu em carreira solo.
Fui no show de lançamento do último disco dela, só com músicas de Guilherme Arantes acompanhadas pelo piano do marido Gérard Gambus. Garanto: a voz segue intocável, parece até mentira. Mesmo alcance, mesma afinação. Uma menina cantando.
Quando Evinha saiu do Trio em 1968, quem entrou foi a irmã mais nova, Marizinha. Para quem não está familiarizado, vou recapitular: o Trio Esperança trazia os irmãos Regina, Mario e Evinha. Eles já eram irmãos de outro trio com vozes deliciosas, o Golden Boys, de Roberto, Ronaldo e Renato mais um primo, Valdir.
Ave! Quanta voz linda!
Marizinha era a caçula. Ela logo também experimentou uma carreira solo.

A voz é EXTREMAMENTE PARECIDA com a de Evinha. O cheiro do hit (foi hit mesmo) também vem do trio compositor Mariozinho Rocha, Renato Corrêa e Paulo Sérgio Valle. Esse compacto saiu em 1977.

Marizinha não chegou a lançar álbum completo solo. Mas ainda tem outras coisas por aí na voz dela. Um exemplo de 1979…

Meio disco music (bem chupada de More More More, para falar a verdade), mas gostosíssima. A versão de Viola Enluarada modernizada é TUDO!!!

Volte e meia ela se apresenta com o Trio Esperança. <3 Ainda quero ver ao vivo.

Dila

Dila é um mistério: ela morreu em um acidente de carro. Só lançou um disco, esse de 1971 que coloquei abaixo.

O álbum era raríssimo até uma reedição mais recente. Ele é inteiro bom.

Mas possui uma única falha. Não inclui esta versão de Wave, que saiu só em um compacto. E que é, nem sei como descrever… É outra coisa.

Cátia de França

Cátia faz parte da turma de nordestinos tipo Sivuca, Amelinha e Zé Ramalho, que vieram tentar a sorte no sudeste. Ela é paraibana e na verdade começou a carreira um pouco antes deles, participando de banda e de festivais. Mas esse disco de estreia incrível, com o título estrondoso de Vinte Palavras ao Redor do Sol, saiu só em 1979.

As músicas nasceram da leitura de poesia do João Cabral de Melo Neto. Todas são dela, com ou sem parceiros. Exalam um misticismo sertanejo e por esse lado é meio primo da produção de Zé Ramalho. Ouve Kukukaya (Jogo da Asa da Bruxa) – é Secos & Molhados, é lindo, é tudo. Sou só eu que ligo essas coisas a Bacurau? É uma viagem pessoal? Risos. Para mim é maravilhosamente interligado.

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“Eu engravido dos livros que leio e tudo vira música.”
— Cátia de França em entrevista para a Trip

Uma pessoa que fala uma frase dessas simplesmente não merece esse mundo horroroso em que estamos vivendo.

Cátia também segue lançando coisas de tempos em tempos. Como essa música, de 1998, bem mística do jeito que a gente gosta:

Você incluiria mais algum nome nessa lista? Me conta!

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August 16, 2020 /Jorge Wakabara
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