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Thina Rodrigues, presente: o desfile 2020 de Lindebergue Fernandes

July 29, 2020 by Jorge Wakabara in moda

Tá, eu vou falar de moda, mas depois vocês me prometem que lêem os outros posts que não são sobre moda aqui nesse blog, tá? É só apertar no logo acima e navegar.

O Dragão Fashion, semana de moda que acontece anualmente em Fortaleza (e que agora chama DFB Festival abrangendo shows e outras atrações), foi outro evento atingido pela pandemia que acabou não acontecendo em sua data prevista e precisou se adaptar para uma versão digital. Ele está rolando agora sob o codinome DFB DigiFest.

Frequentei o Dragão faz tempo, e faz tempo que não vou. Na época em que eu ia, me empolgava bastante com o que via: desfilavam por lá coisas que ainda estavam fora do radar do eixo Rio-SP mas que eram muito bacanas, como Mark Greiner, Vitorino Campos, Helen Rödel.

E também tinha Lindebergue Fernandes, um criador com um universo muito próprio que misturava referências superpopulares camp com streetwear e possuía um senso de ironia próprio do Ceará, que no lugar de diminuir meio que exalta seu alvo. Para isso, há que se ter sensibilidade – poucos conseguem.

Lili seguiu participando do Dragão e, nessas suas referências todas, acrescentou a política. É sempre um discurso sem firula, colocando-se pró minorias. Nesse DFB DigiFest, sua apresentação que foi ao ar pelo YouTube ontem homenageou Thina Rodrigues, fundadora da Associação das Travestis do Ceará (ATRAC). Thina morreu faz um mês, um dia depois do Dia do Orgulho LGBTQ+, vítima da COVID-19.

Quem abre o desfile é o incrível Silvero Pereira, que ficou nacionalmente conhecido com Bacurau mas que já era figura celebrada no Ceará. O vestido que Silvero usou no Festival de Cannes em 2019 era assinado por Lindebergue.

silvero-lindebergue.jpg

Esse aqui!

Pá!!!!

Thina é a parte que simboliza o todo: presa por ser travesti nos anos 1980, símbolo de poesia e resistência, ela não morreu como parte das estatísticas de ataques transfóbicos, mas em decorrência do coronavírus que, está provado estatisticamente, é ainda mais avassalador entre comunidades marginais.

O vestido que Silvero usa, em tecido cru e de mangas bufantes, é aberto atrás, atrevido e ao mesmo tempo remetendo a camisola hospitalar. O texto que a gente ouve no começo da trilha é da Inês Brasil – ela já tinha virado notícia durante uma live, quando fez um desabafo. Um grito de uma mulher preta que não aguenta mais a situação chocante do país e a nossa falta de reação.

Inês Brasil dando o papo! pic.twitter.com/pRRGqkhNLn

— Rene Silva (@eurenesilva) July 12, 2020

A estampa criada por Maurício Alexandre, essa dos sertanejos de mãos dadas, traz a mensagem "ninguém solta a mão de ninguém" – ela aparece em diversas peças, inclusive na manga nuvem que é uma das marcas de Lindebergue.

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Teve o talento de @silveropereira no desfile-manifesto de @lindebergue 📸 @igorcavalcantem #dfbdigifest #livemoda

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Quem fecha o desfile é Yara Canta, artista trans, usando uma cabeça-turbante-black-power-arco-íris-pantera-floral criada pelo artista plástico Ciro Alencar mais um vestido balonê com cores veladas pela transparência branca que envelopa e protege. Simbologias para refletir e apreciar.

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Desfile para @lindebergue no @dfbfestival. 📸: @igorcavalcantem @estudioigorcavalcante

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O DFB DigiFest continua. Confira a programação de desfiles no site deles.

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July 29, 2020 /Jorge Wakabara
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moda
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Cicciolina e coisas que vão te surpreender agora (você era muito novo pra entender!)

July 27, 2020 by Jorge Wakabara in TV, arte, política

Não gostava da figura da Cicciolina quando era pequeno. Não sei se por moralismo – acho que não, eu era pequeno demais para entender e tinha coisas que eu gostava e eram bem, er, liberadas. Mas eu tinha uma aversão inexplicável. Tipo não ia com a cara, mesmo. Também não acho que era minha homossexualidade de criança viada escolhendo um lado… talvez. Será que a minha homossexualidade se sentia ameaçada? Risos!

Para resumir a questão, fui assistir ao documentário Os Escândalos de Cicciolina, disponível no GNT Play e no Now (para quem é assinante dos canais da Globosat). E descobri que na verdade eu sabia pouquíssimo sobre a Cicciolina, e que hoje eu acho a Cicciolina o máximo!
Claro que, influenciado pelo doc, me deixei levar por uma obra que é claramente favorável a ela. Pouca gente problematiza o alter-ego de Ilona Staller no programa (que tem menos de uma hora), e quem o faz tem a sua capacidade analítica discretamente colocada em xeque (leia-se: uma francesa que faz parte do Femen e paga de doida etc.).

Mesmo assim, decidi revisar minha opinião sobre Cicciolina com profundidade. Reduzida à atriz pornô, ela é certamente muito mais do que isso. Um ícone. Um mito vivo. Provocante e inocentemente dionisíaca com seu ursinho de pelúcia. Ela sabia tudo o que estava fazendo e promovendo? Era manipulada? Era dona de sua própria sexualidade ou reforçava a objetificação da mulher? Era vanguardista? Era feminista, apesar de ser odiada pelas feministas? Era uma vigarista?
Acho que ela era (e é, ainda está viva aos 68 anos) uma personalidade complexa, que a gente não consegue definir com poucos adjetivos.
Por exemplo: ela afirma que perdeu a virgindade aos 18 anos. Tá boa?

Segue aqui o meu quinhão.

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Pra começo de conversa

Amo os looks. Amo a era do make rosa na sobrancelha. Amo o eterno sorriso. Amo o loiro ultrablondor. Amo o eterno rosa millennial. Todo ícone precisa de simbologias: ela tinha as dela!

Cicciolina não é italiana

Pois bem. Ela é húngara. Nasceu em Budapeste numa Hungria dominada pelos soviéticos e portanto em regime comunista. Foi Miss Hungria. Casou (com um italiano). E isso tudo antes de virar a Cicciolina. Mais chocante ainda: Cicciolina foi espiã!!!

Cicciolina: a Mata Hari húngara

A própria Ilona conta em biografia que ajudou o governo da Hungria com informações sobre diplomatas americanos que se hospedavam no hotel de luxo onde ela trabalhava do meio para o fim dos anos 1960!

E não é só: ela também diz que fez o mesmo tipo de serviço, já na Itália, mas que tem medo de falar sobre o assunto e acabar assassinada ou com algum parente prejudicado.

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Marca registrada

Antes de Lana del Rey e todas as frequentadoras do Coachella: Cicciolina já usava coroa de flores. Era um símbolo do seu personagem!

Na Itália: um programa erótico… de rádio!

Ao se separar do marido mas já morando na Itália, Cicciolina encontrou com Riccardo Schicchi, o pornógrafo que a ajudou a construir sua imagem. E foi em 1973, já em Roma, que ela começou a fazer o programa de rádio Voulez-vous Coucher Avec Moi?, no qual ela dava dicas de sexo e falava de sexo, mas para ela, estava falando de amor. Assumiu o nome Cicciolina na rádio e posou em fotos hoje clássicas de Schicchi.

Cicciolina com Schicchi: eles chegaram a ser um par também amoroso

Cicciolina com Schicchi: eles chegaram a ser um par também amoroso

Uma influência para… Xuxa?

Olha, eu não sei, mas tem algo aí, viu.
Cicciolina, que é um nome inventado, se despedia dos ouvintes com "bacini bacini bacini", que é "beijinho beijinho beijinho” em italiano. Ela também batizou seus fãs de cicciolini, mais ou menos do mesmo jeito que a Xuxa falava dos seus baixinhos.
A beleza loira magnética, pouca roupa, esse ar de lolita.
Não tenho provas, mas tenho indícios…

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Cafona ou cult?

Cicciolina já foi musa de muita gente. Em 1976, um filme italo-iugoslavo de Miklós Jancsó chegava no Festival de Cannes e causava escândalo: era Vizi Privati, Pubbliche Virtù. Supererótico, ele trazia as aventuras de um herdeiro de um trono na virada do século 19 para o 20 e era bem visual, com orgias e nudez frontal. Cicciolina estava ali mas num papel secundário: era uma participante da orgia. Nudez nunca foi problema para Ilona Staller: tal qual Dercy Gonçalves, bobeou ela tava colocando a teta pra jogo – na rua, na TV, no restaurante…

A coisa já seria diferente em 1989, elevada de maneira polêmica ao status de arte. Casada com o artista Jeff Koons, Ilona participou da série Made in Heaven, na qual Koons investigava a estética pornô e tudo que a atriz construiu com Schicchi.

Esculturas, fotos: tudo bem gráfico em Made in Heaven

Esculturas, fotos: tudo bem gráfico em Made in Heaven

Desde 1983 Cicciolina tinha ido além de ficar pelada e insinuante em qualquer lugar que lhe desse na telha e começou a atuar em filmes pornô hardcore. Então Koons sabia bem o que estava fazendo. Quando se separaram, a briga foi feia e bem litigiosa – tanto que, dizem, Koons destruiu quase todas as obras que compunham Made in Heaven num acesso de raiva.

Imagina ser filho da Cicciolina com o Jeff Koons?

Ele existe. Ah, sim. E seu nome é Ludwig Koons.

Parece que ele fez harmonização facial mas ele é assim mesmo

Parece que ele fez harmonização facial mas ele é assim mesmo

Centro de uma disputa de guarda na separação, Ludwig acabou ficando com a mãe. Hoje, tem quase 30 anos, sonha com uma carreira por trás das câmeras de cinema e declarou em 2019 que, se fosse cidadão norte-americano, votaria no Donald Trump.
Putz…
E a mãe dele, hein? Bom…

O primeiro partido de Cicciolina era… ANARQUISTA

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Nem sei o que dizer! A fama pop de Cicciolina se deve muito a ela não ter se conformado só em ser uma celebridade da mídia, uma mistura de artista e pornógrafa. Ela entrou para a política e acabou eleita, ocupando uma cadeira no parlamento italiano entre 1987 e 1991. Muita gente acha tudo isso uma grande palhaçada, mas o mais, digamos, original é que esse partido com o qual Cicciolina conseguiu ser uma das mais votadas era o Partito Radicale, de raízes anarquistas!

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Faz sentido!

Entre os feitos de Ilona como deputada, o mais importante talvez seja o direito à visita íntima para a população carcerária. Depois, ela fundou o Partito dell’Amore. E uma das suas declarações políticas mais famosas foi se oferecer a transar com Saddam Hussein e Osama Bin Laden pela paz mundial!

Antes disso, Cicciolina diz que já se envolvia com política antes, inclusive com uma tentativa de fundação de um partido verde que não deu certo. Ela já afirmou, em entrevistas, que é de esquerda.

Cicciolina piu pop

Cicciolina já inspirou tantas que fica difícil enumerar. Miranda Kerr já posou como ela para a V Magazine em 2013. Fausto Fawcett compôs a música Cicciolina (O Cio Eterno), lançada no álbum dele de 1989. Em 1990, o grupo eletrônico Pop Will Eat Itself lançou a música Touched by the Hand of Cicciolina. E adivinha só onde uma música inspirada nela quase foi parar…

Erika Vikman concorreu com essa música à vaga finlandesa do Eurovision 2020. Tem coisa mais perfeita? Quase ganhou – ficou em segundo lugar. De qualquer forma, o Eurovision acabou não acontecendo nesse ano.

A própria Cicciolina já lançou discos

Não que isso seja estranho, né? Era comum que artistas que não cantavam nada gravassem discos mesmo assim para tentar capitalizar ainda mais em cima de sua fama (leia-se Xuxa… risos).
No primeiro disco que gravou, chamado Ilona Staller e lançado em 1979, tem uma faixa deveras interessante. Cavallina Cavallo foi composta por Ennio Morricone, ele mesmo, para o filme Dedicato al Mare Egeo (que pelo que entendi foi lançado apenas no mercado japonês). A versão que aparece no longa, que traz Cicciolina como uma de suas estrelas, não é essa e sim a com a voz da cantora Edda dell’Orso.

Olha outra faixa desse mesmo disco:

Existe um álbum lançado somente no Brasil, o Sonhos Eróticos (1988), que tem duas músicas de Cicciolina, Muscolo Rosso e Avec Toi, com outras interpretadas pela Erotic Dreams Band (provavelmente uma banda de estúdio assumindo esse nome) e La Prima Volta contendo trechos de falas de Cicciolina.
Muscolo Rosso se refere a ele mesmo. O pinto.

“Cicciolina è un sogno della società italiana. Dico “sogno” non nel senso di una realtà desiderata, ma nel senso di qualcosa di profondo che affiora involontariamente e con cui si devono fare i conti. Di questo tipo di sogno, che può essere terrificante, l’apparizione di Cicciolina ha l’aspetto trasgressivo, sacrilego.”
— Federico Fellini sobre Cicciolina

Cicciolina na TV brasileira

É! Cicciolina já participou de uma novela! Você não lembra?!

O babado era certo. Xica da Silva, que passou na Rede Manchete entre 1996-97, teve Cicciolina no papel de uma princesa de Gênova. Para quem não lembra, Xica da Silva tinha um certo ar de pornochanchada. Nada explícito, mas tudo muito… sugestivo!

Teve outro momentinho de Cicciolina na TV nacional. Esse aqui:

QUEM AMA UMA ENTREVISTADORA??? EU!

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Sexo ou arte? Por que a nudez de Cicciolina seria menos artística do que a das estátuas da Grécia e de Roma?

Sexo ou arte? Por que a nudez de Cicciolina seria menos artística do que a das estátuas da Grécia e de Roma?

July 27, 2020 /Jorge Wakabara
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TV, arte, política
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"I'm not a Heather, I'm a Veronica": Heathers, que inspirou Ryan Murphy, que inspirou Heathers

July 27, 2020 by Jorge Wakabara in cinema, TV

It's just!
Se você ainda não assistiu a Heathers, o filme de 1988 que em português ganhou o infeliz nome de Atração Mortal, pare tudo e ASSISTA. Mas antes, um aviso: talvez você não goste. Nem todo mundo gosta. Heathers é comédia de humor macabro, brinca com valores com os quais muita gente ainda se identifica, mexe com a “instituição” bullying de um jeito que poucas (ou nenhuma?) obra de ficção conseguiu depois, e mais importante de tudo… fala de suicídio adolescente, que pode ser um gatilho para muita gente.
Avisos feitos, vamos lá. Vou tentar não dar spoilers, mas acho que pode rolar umas escapadas – você foi avisado.

Veronica Sawyer (Winona Ryder) e Jason Dean (Christian Slater) em um dos velórios de Heathers

Veronica Sawyer (Winona Ryder) e Jason Dean (Christian Slater) em um dos velórios de Heathers

Quem diria que ia dar certo? Pouca gente. O próprio roteirista Daniel Waters, em entrevistas, reconhece que foi ingênuo e não pensou nos efeitos que sua escrita poderia causar. Ele simplesmente escreveu o que queria ver. Na época, todos os longas teen clássicos de John Hughes já tinham sido lançados e portanto o "panteão mítico” do high school norte-americano já havia se espalhado pelo mundo via Hollywood. Antes de Heather Chandler (Kim Walker), existiu Benny (Kate Vernon) e suas amigas em A Garota de Rosa-Shocking; antes do jock Ram (Patrick Labyorteaux) tivemos os bullies Ian (Robert Downey Jr) e Max (Robert Rusler) em Mulher Nota 1000; antes do bad boy Jason Dean tivemos John Bender (Judd Nelson) em Clube dos Cinco.

E principalmente: antes de Winona Ryder tivemos Molly Ringwald. Uma nova it girl roubava os holofotes, e essa tinha um toque dark, próprio dos anos 1990 que chegavam. Se a princesa Claire (Ringwald) ficou com Bender no fim do Clube, isso era apenas um prenúncio da síndrome de Jean Grey: é para ela ficar com o Ciclope, mas o Wolverine lhe parece estranhamente irresistível…
Ringwald de certa forma fez isso com o roqueiro moderno Dweezil Zappa, mas Winona ultrapassaria essa marca: enquanto Veronica Sawyer participava efetivamente da trama ao forjar o bilhete de suicídio de uma das Heathers (ela no mínimo poderia ser acusada de cúmplice), a atriz em si namoraria com Slater (em algum momento das filmagens ele deixaria a então namorada Walker para ficar com Ryder), Johnny Depp, David Pirner (o vocalista do Soul Asylum)… E, principalmente, ELA MESMA tomaria o papel de bad girl ao ser presa roubando na Saks. Sua posição de musa cult depois de Edward Mãos de Tesoura (1990), Caindo na Real (1994), Garota Interrompida (1999) e principalmente o próprio Heathers confunde personagem e vida real e a deixa sujeita à empatia e identificação pela Geração X, que simplesmente trocou Molly por ela. Não que Molly fosse menos moderna ou carismática… Os anos 1990 pediam por algo mais grunge, simplesmente. Menos perfeito.

E o mesmo pode ser dito sobre Heathers em si. Regina George (Rachel McAdams) em Meninas Malvadas é basic bitch perto das Heathers. Elas são o molde real das outras. O menor exagero no bullying confrontado com elementos estranhamente sedutores (críquete? frases maravilhosas que a gente nunca acreditaria que saíram da boca de uma garota do Ensino Médio porque são mais apropriadas para uma bicha de um conto de Caio Fernando Abreu?) fazem Heather Chandler ser mais realista e assim ficar ainda mais odiosa.

Jason Dean, ou JD, vem para completar o cenário. Fora a comparação óbvia com James Dean, o rebelde sem causa ainda vem com uma referência bônus escondida. O livro que Heather Duke (Shannen Doherty) lê é Moby Dick por motivos financeiros: a ideia inicial seria que ela estivesse lendo O Apanhador no Campo de Centeio. Fora o fato do livro de JD Salinger (olha aí, JD, hein, hein) ser cult, tipo existencialismo para adolescentes, ele era (e é) um pedido comum de leitura das aulas de literatura norte-americana do high school dos EUA. Mas Salinger não quis ceder os direitos – e Moby Dick virou a nova pedida porque seus direitos tinham expirado, já era domínio público. Para quem não está familiarizado, Moby Dick tem mil simbolismos discutidos ao longo dos anos (não é à toa que é um clássico), entre eles a discussão de valores morais da sociedade, a sede por dinheiro corrompendo as relações, os limites da humanidade e por aí vai. Faz sentido.

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Heathers foi considerado um fracasso de crítica e de bilheteria na época do seu lançamento. A redenção só veio depois, em vídeo, quando o filme foi se transformando num clássico cult e teve impacto na cultura pop comparável aos hits de Hughes. Frases e expressões que Waters inventou viraram realidade na boca dos adolescentes, Heather virou um substantivo para a gente se referir a bullies ricas e o filme se transformou em inspiração para, bem… Ryan Murphy. Porque afinal o longa é a cara do Ryan Murphy (na minha opinião, um pouco menos glamouroso, menos mainstream, menos superproduzido e por isso mais legal, mas você entendeu).

Ryan Murphy: origins

No começo, era Popular. A série de duas temporadas que Murphy criou com Gina Matthews e passou na TV americana entre 1999 e 2001 já trazia uma discussão sobre popularidade no Ensino Médio. De um lado a cheerleader Brooke McQueen (Leslie Bibb), do outro a nerd Sam McPherson (Carly Pope), cada uma popular em seu "segmento" – elas se vêem forçadas a conviver quando o pai de uma e a mãe de outra começam um relacionamento. Com isso, essa turma toda precisa aprender a socializar, já que Brooke e Sam passam a morar na mesma casa. Ou seja: já existiam umas Heathers aqui, sim?

Mas o sucesso de Ryan viria na forma de Nip/Tuck (2003-10), sobre uma dupla de cirurgiões plásticos. E a consagração? Glee (2009-15).

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Bom, não vou falar da Naya Rivera nem da Lea Michele porque não é essa a ideia. Mas enfim: RIP Naya, Lea quem-se-importa-com-essa-tonta.

Queria atentar que, por mais que na sua extensão Glee tenha se transformado numa novelinha musical besta, no começo ela tinha um pulo do gato muito interessante: o seu foco seria na Martha Dunnstock, e não exatamente nas Heathers (apesar de, sim, as cheerleaders Cheerios serem Heathers). Ou seja: o foco era nas vítimas de bullying. Em parte, o tema central eram os conflitos entre os populares e os "esquisitos", os marginalizados, mas acima de tudo as lentes estavam nas vítimas mudando de papel num subgrupo dentro da escola: o coral. No caso de Rachel Berry (Lea Michele), ela vai de zoada à rainha da cocada preta. Eles constroem uma outra hierarquia à sua maneira e à parte da estrutura social da escola toda.

E bom, existia o fato de ser um musical, coisa que eu não aguento, mas com Glee eu tinha aquele guilty pleasure de querer saber o que ia acontecer com aquele bando de personagem raso em tramas e reviravoltas ridículas mesmo tendo que aguentar versões pasteurizadas de músicas em sua maioria boas.

Como a gente está falando de bullying, é claro que Heathers pairava como uma referência em cima de Glee. Mas Murphy citou Heathers nominalmente em entrevista depois, em 2015, na sua nova aposta na época… Scream Queens (2015-16).

As Chanels de Scream Queens

As Chanels de Scream Queens

No lançamento, grande parte das manchetes foi dominada pela participação de Ariana Grande (como Chanel nº 2) e Nick Jonas (como Boone) na primeira temporada, mas a presença de Jamie Lee Curtis (num papel estranhamente parecido com a Sue Sylvester de Jane Lynch em Glee, um dos fatores que reforçam a crítica a Murphy de que ele se repete muito) e o próprio título conecta a série a filmes de terror adolescente, mais especificamente à franquia de Halloween na qual Curtis fazia uma scream queen em si. Scream queen virou uma expressão para as "mocinhas” desses longas que não fazem muito mais do que gritar e fugir do assassino, alvo de crítica porque esconde um machismo ao colocar a mulher sempre no papel de vítima indefesa e incapaz. É mais complexo que isso (tem scream queen que mata o assassino sozinha), mas resumidamente é por aí!

Na série, assim como no filme Heathers, os papéis se confundem. Nenhuma menina aparece gritando em Heathers. E Veronica Sawyer está longe de ser uma vítima, apesar de se vitimizar. Em Scream Queens elas gritam, até demais. Mas sempre fica a dúvida: elas são vítimas ou são serial killers?

Em plena Comic-Con, Murphy declarou em 2015 que Scream Queens era um encontro de Halloween e Heathers. O maior aceno de todos está na turma das Chanel, liderada por Chanel Oberlin (Emma Roberts). Ao contrário das Heathers, que por coincidência têm o mesmo nome, na série as outras Chanel mudaram de nome a mando da primeira, sendo apontadas como Chanel nº 2, 3, 4… O verdadeiro nome de Chanel nº 5, por exemplo, é Libby Putney (Abigail Breslin).

Uma mudança importante é que Scream Queens se passa numa universidade. O que é bem esquisito, já que os dramas e a trama continuam sendo adolescentes demais.

Chanel nº 3 (Billie Lourd), Chanel Oberlin e Chanel nº 5 na segunda temporada de Scream Queens, que conseguiu ser mais imbecil que a primeira – e talvez por isso até mais divertida, no sentido camp da coisa?

Chanel nº 3 (Billie Lourd), Chanel Oberlin e Chanel nº 5 na segunda temporada de Scream Queens, que conseguiu ser mais imbecil que a primeira – e talvez por isso até mais divertida, no sentido camp da coisa?

O fator “adolescentes assassinos” grita Heathers (desculpa o trocadilho). Mas Murphy tirou algo muito importante da fórmula: a simulação de suicídio. Já fica óbvio, logo de cara, que existe um serial killer entre os personagens.

Nesse meio tempo, em 2010, e talvez olhando para o sucesso de Glee, cometeram uma coisa que, eu sei, tem muitos fãs, mas eu acho um grande cocô fedido… Heathers: the Musical.

POR QUE OS NORTE-AMERICANOS PRECISAM TRANSFORMAR TUDO EM MUSICAL, CAZZO???

Heathers: the Musical estreou em 2014 em Los Angeles. A história é basicamente a mesma só que com música. Dói demais.
Só que virou mais um cult. Sinceramente, como costumo observar as pessoas que estão ao meu lado nas trincheiras, nem todo mundo que ama o filme gosta do musical e isso já diz muita coisa. Para mim, ele pensa demais no mainstream. É Murphy demais. O humor macabro perde muito da sua ironia fina. As músicas que exploram o sentimento dos personagens (e portanto são sentimentalistas) tentam explicar demais, deixam tudo mastigadinho e sem lugar para interpretações. Tudo ganha um ar de moralismo fake. Praticamente vira um similar do hit fictício do filme original Teenage Suicide (Don't Do It).

O musical ganhou diversas montagens. Em 2019, chegou no Brasil.

Riverdale, aquela série besta, ganhou um episódio na sua terceira temporada (2019) em que a escola vai montar o musical (existe uma versão especial de Heathers: the Musical para montagens escolares desde 2016, tipo "censura livre", com cortes e adaptações). Eu assisti ao episódio para você não ter que passar por essa tortura. É como um Glee com personagens de Riverdale, ou seja, um dos sinais do apocalipse. Eles não disfarçam as obviedades no casting, como Cheryl Blossom (Madelaine Petsch) no papel de Heather Chandler e Betty (Lili Reinhart) e Veronica (Camila Mendes) fazendo as outras Heathers. Veronica Sawyer é interpretada por Josie (Ashleigh Murray), mas eu acho que tem uma música que era pra ser dela e é cantada pela… Veronica da Camila Mendes. Risos. Ah: e quem assume o JD é Sweet Pea (Jordan Connor) e não Jughead (Cole Sprouse), como os fãs poderiam esperar, ou mesmo Archie (KJ Apa).
Enfim: better to be gently fucked by a chainsaw do que assistir isso.
(Desculpas sinceras para minha sobrinha Gabriela, eu sei que ela gosta)

Enquanto isso, depois de Scream Queens e de 13 Reasons Why (2017-20), parece que liberou. Em 2009, surgiram as primeiras notícias de que Heathers, mesmo envolvendo o tabu do suicídio adolescente, viraria uma série de TV pela Sony. Em 2012, surgiu um papo de que seria uma série da Bravo. Mas a coisa ainda demoraria a engrenar. Ela viria pelas mãos da Paramount, mas sofreria adiamento e cortes por causa de mais tiroteios em escolas dos EUA. Querendo evitar cutucar o vespeiro, a Paramount postergou a estreia o quanto pode. O primeiro trailer só saiu em 2018.

A série Heathers que não é de Murphy – mas poderia, em suas qualidades e, principalmente, seus defeitos

O trailer sofreu uma saraivada de críticas. Era pra tanto? Bom… se o filme já desperta opiniões fortes, a favor ou contra, a série jogou gasolina em tudo.

Haters gonna hate: Veronica Sawyer (Grace Victoria Cox), Heather Chandler (Melanie Field), Heather Duke (Brendan Scanell) e Heather McNamara (Jasmine Mathews)

Haters gonna hate: Veronica Sawyer (Grace Victoria Cox), Heather Chandler (Melanie Field), Heather Duke (Brendan Scanell) e Heather McNamara (Jasmine Mathews)

Logo de cara as coisas ficam confusas. Ao mesmo tempo que a série é um reboot, com praticamente todos os personagens reinventados mantendo seus nomes e as frases que fizeram tanto sucesso na obra original, quem conhece a primeira versão fica confuso ao ver ela…

SHANNEN FUCKING DOHERTY

SHANNEN FUCKING DOHERTY

Sendo que ela era ela…

Heather Duke (Doherty) em Heathers (1988)

Heather Duke (Doherty) em Heathers (1988)

Ué???

Acontece que a participação de Doherty é só uma graça, um dos vários acenos que a série faz para o filme. O papel dela é da mãe de JD (James Scully). Só que ela tem o clássico frufru vermelho símbolo da menina mais popular da escola no filme original (a princípio Heather Chandler). Tá vendo na foto? Existe uma brincadeira no longa de que Heather Chandler sempre escolhe o taco vermelho no críquete, mas isso era bem sutil – no musical o vermelho vira “a cor” de Chandler e, em Riverdale, a “possessividade” do vermelho é explorada com Cheryl Blossom.
O frufru da mãe de JD acaba com Veronica na série.

Essa nova versão de Heathers faz brincadeiras tipo fan service. Umas mudancinhas. Algumas funcionam e outras não. Quem joga críquete com Veronica é Betty Finn (Nikki SooHoo). E Veronica quem manda. Ela sempre quer o taco azul.

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Mas o principal é que num mundo pós-Glee e politicamente correto, com celulares e a sede por seguidores e likes, o conceito de popularidade adolescente não é mais o mesmo de 1988. O novo Heathers incomoda porque faz troça do discurso politicamente correto, da representatividade, do que a gente valoriza hoje. A pobre cheerleader é secundária, quase figurante. E Heather Chandler é gorda, body positive, cool, artsy… e ainda assim uma desgraçada que faz bullying. Sim, o feitiço virou contra o feiticeiro; a minoria ficou popular e é quem manda – a cena em que um pai chora no filme, dizendo que tem orgulho do seu "filho homossexual morto”, vira uma cena em que o pai chora dizendo que tem orgulho da sua "filha heterossexual morta".
Hum… É engraçado, mas por quê? Não é uma forma de embutir que as ideias progressistas talvez estejam “exageradas demais"? Não curto essa onda. Talvez por que me sinta atingido? É bem complexo. Mas não me parece certo fazer comédia sobre conquistas das minorias de uma maneira tão sinistra e insensível.

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Ah, sim: e se você não percebeu, Heather Duke é gender fluid (atende pelos pronomes ela/dela) e Heather McNamara é negra e lésbica.
Veronica? É uma garota branca, loira, de olho claro, normal. Não é careta mas tem todos os privilégios que poderia.
A série não segue a história do filme, mas trata dos mesmos temas. E é bizarramente Murphy, apesar dele não estar envolvido na sua criação. Simplifica questões, resolve conflitos de maneira pueril, faz reviravoltas folhetinescas absurdas. E tem momentinhos musicais (ARGH). O descaso é tanto que um dos personagens que morrem no fim de um episódio não causa impacto nenhum no episódio seguinte; a sua morte é citada, meio por cima. Sem drama, ninguém ficou exatamente chateado, feliz ou minimamente atingido. Seria um statement se isso acontecesse com as outras mortes de maneira similar – e não, as outras mortes são encaradas de maneira muito mais importante.

A mensagem que fica é mais ou menos "ninguém é inocente". Do tipo “o sonho do oprimido é ser um opressor".
Pra mim, até uma das sacadas mais legais do roteiro, que coloca o JD com um discursinho meio 4chan, quase incel, é estragada pelo exagero – tem uma hora que você não aguenta mais ouvi-lo falando. Nem a Veronica!

E na comparação, o carisma de James Scully fica devendo pencas pro Christian Slater

E na comparação, o carisma de James Scully fica devendo pencas pro Christian Slater

Uma das únicas coisas que realmente prestam é… Selma Blair. Ela faz a madrasta de Heather Duke, uma prostituta vulgar que é bem estereotipada mas ao mesmo tempo maravilhosa.

E o fim? Bom, Heathers, o filme, tinha um fim previsto que acabou sendo descartado porque os produtores acharam que era pesado demais para um filme adolescente. Na versão pasteurizada da série, eles conseguiram reproduzir mais ou menos esse fim original. E é ruim demais, viu?
Ruim demais.
Depois não vai dizer que eu não avisei.
Heathers, a série, está disponível na Globoplay.

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July 27, 2020 /Jorge Wakabara
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cinema, TV

Shibuya-kei sem ser no Japão: de Swing Out Sister a outros deliciosos pastiches

July 22, 2020 by Jorge Wakabara in música

Ah, o zeitgeist…

Você sabe o que é Shibuya-kei? Eu dei uma explicação bem completa no terceiro episódio da primeira temporada do programa Quatrilho no meu podcast, quando falei do Pizzicato Five. Mas para quem está com preguiça de ouvir, segue aqui: Shibuya é um bairro de Tóquio e, lá no começo dos anos 1990 começou a despontar por ali uma espécie de movimento. É que os xóvens estavam gostando de certo tipo de som, uma coisa nostálgica revisitada com eletrônica, um pastiche irônico de Burt Bacharach, Phil Spector, Serge Gainsbourg, Beach Boys… No Japão, faziam parte Pizzicato Five, Flipper's Guitar, Original Love e outras bandas (também tem esse post no qual falo mais).

Acontece que o movimento era mundial – muita gente também inclui Dimitri from Paris, April March e até o Pato Fu entre os representantes do Shibuya-kei. Esse interesse pelas músicas dos anos 1960, pelo retrofuturismo e pela orquestração à moda wall of sound do Spector já estava pintando desde os anos 1980. Enxergo vários pontos de partida longe de Tóquio. Muitos deles aconteceram em outra ilha, no Reino Unido.

Dusty Springfield & Pet Shop Boys

O ano era 1987 e o álbum era Actually, dos Pet Shop Boys. Eles decidiram resgatar um ícone vivo que naquele momento estava injustiçado, bem longe das paradas de sucesso. Nada menos que Dusty Springfield.

Não tem como deixar de enxergar a combinação entre pop eletrônico e as canções arranjadas por Spector aqui. Dusty, que tinha uma história muito particular com o soul mesmo sendo branca, era símbolo dessa memorabilia que o Pet Shop Boys curtia e queria reverenciar. Dusty in Memphis, o álbum de 1969, segue como um dos maiores clássicos da música pop.

Depois do sucesso que foi What Have I Done to Deserve This, feita especialmente para a participação de Dusty, a dupla e a cantora colaboraram em Nothing Has Been Proved. Mais referente aos anos 1960 ainda, a música foi uma encomenda do produtor Stephen Woolley para o filme Scandal de 1989, sobre o caso Profumo de 1963 que abalou a política britânica na época. Nothing cita nomes envolvidos e fala que Please Please Me, canção dos Beatles, estava no topo das paradas. A gente quase não se toca ao ouvir a música descompromissadamente, mas ao colocá-la no contexto do Shibuya-kei, conseguimos enxergá-la como uma faixa dos primeiros discos do Pizzicato Five!

O disco de 1990 de Dusty, Reputation, ainda contaria com outras três faixas compostas e produzidas pelo Pet Shop Boys fora Nothing: In Private, Daydreaming e Occupy Your Mind, tudo isso no lado B. Mas também é interessante uma faixa do lado A do disco: Arrested by You, composta pela dupla Rupert Hine e Jeanette Obstoj, ganhou produção de Paul O'Duffy. Sabe quem é ele?

Swing Out Sister: tudo no último minuto

Corinne Drewery sempre diz em entrevista que tanto o nome, Swing Out Sister, quanto o primeiro sucesso deles, Breakout, foi resolvido de última hora, quando eles tinham que apresentar algo ou estavam fora. Pois sim: Breakout foi "resolvida” momentos antes de ser gravada no estúdio! Quando o single de Breakout saiu, em 1986, foi um, er, breakout. E quem era o produtor? Adivinha… Paul O'Duffy!

Paul, só para você saber, seria o dono do estúdio caseiro onde Amy Winehouse trabalharia em algumas faixas do que se tornaria o clássico Back to Black (2006). A faixa Wake Up Alone tem créditos para Paul e Amy.

Na época de Breakout o Swing Out Sister era um trio, com Corinne abandonando uma carreira de modelo e estilista para se juntar aos músicos Andy Connell (teclados) e Martin Jackson (bateria). Você quer mais paralelos com o Pizzicato Five? Bom, logo após esse primeiro álbum, Jackson sai (e vai trabalhar com ninguém menos que Frank Zappa) e o trio vira duo. Foi com essa formação que eles lançariam o próximo álbum, Kaleidoscope World, de 1989, e chegariam em Am I the Same Girl? em 1992 no disco Get in Touch With Yourself.

Am I the Same Girl? na verdade é uma regravação de Barbara Acklin de 1968. E teve uma outra pessoa que regravou a canção no ano seguinte ao lançamento de Barbara… Dusty Springfield! Dusty era referência de Drewery, de Winehouse… e certamente de Maki Nomiya no Pizzicato Five.

O mundo é do tamanho de uma azeitona, né?

A mistura de jazz e pop do Swing Out Sister ganhou um outro nome entre os críticos musicais: eles seriam conhecidos como um dos maiores representantes do sophistipop. Isso mesmo: SOPHISTIPOP. It's a thing, google it!

O Swing Out Sister existe até hoje e segue lançando álbum até hoje, mas sem chegar perto do sucesso que conquistou até 1992. O importante é que: eles seguem ótimos!!! E, não obstante, tem um séquito de fãs fiéis… no Japão.

Uma coisa que caracteriza o Shibuya-kei é a programação visual caprichada do material gráfico que seus "membros” apreciam. Swing Out Sister: check! Tem uma coisa retrô, fashion e divertida que as bandas japonesas também amavam

Uma coisa que caracteriza o Shibuya-kei é a programação visual caprichada do material gráfico que seus "membros” apreciam. Swing Out Sister: check! Tem uma coisa retrô, fashion e divertida que as bandas japonesas também amavam

Além de Dusty: Sandie Shaw e os Smiths!

Muita gente nessa década de 1980 compartilhava desse gosto pelo pop retrô com Neil Tennant e Chris Lowe. Um desses colegas era Morrissey, tanto é que ele convenceu Sandie Shaw, aquela que cantava (There's) Always Something There to Remind Me em 1964 e que ganhou o Eurovision em 1967 com Puppet on a String, a ouvi-lo numa proposta…

Morrissey tinha uma fascinação com cantoras pop de duas décadas atrás por influência do New York Dolls, dizem. E ele e Johnny Marr queriam ser respeitados como compositores, tanto quanto com a banda The Smiths em si. Então eles decidiram convencer Sandie a gravar uma música deles. Muito bem: depois de muito trabalho para ela aceitar, eles entraram em estúdio em 1984 para gravar Hand in Glove, que havia sido o primeiro single dos Smiths em 1983. Repare que os Smiths ainda estavam no começo da carreira! E Sandie diz que ficou chocada ao receber o single de Hand in Glove, que traz a bunda do ator George O'Mara em foto de Jim French. Ela teria dito para o marido: "He’s started sending me pictures of naked men with their bums showing!".
Bom, parece que no fim a bunda venceu…

Mandaram nudes para Sandie…

Mandaram nudes para Sandie…

Sandie lançou o álbum Hello Angel em 1988. O single Please Help the Cause Against the Loneliness foi escrito por Morrissey e o produtor Stephen Street. O disco ainda traz Cool About You, uma música inspirada nos hits de Phil Spector e composta por Jim e Willian Reid do The Jesus and Mary Chain. Outra regravação é A Girl Called Johnny, originalmente da banda The Waterboys e inspirada em Patti Smith.
Deu para perceber que esse disco da Sandie é ótimo?

A olhos nus: Sandie de novo

Ah, e lembra do sucesso (There's) Always Something There to Remind You da Sandie? Composta por Bacharach e Hal David, ela reapareceria em versão synthpop em 1982 com o Naked Eyes. No Brasil, acredito que essa versão acabou fazendo mais sucesso que a original principalmente pela sua inclusão da trilha sonora da novela Guerra dos Sexos! E de fato ela é ótima, aqueles sinos do começo são SHOW, as batidas do refrão idem.

Já que falamos deles: Psychocandy, do The Jesus and Mary Chain

A música que abre Psychocandy (1985), Just Like Honey, simplesmente empresta a bateria de um sucesso de 1963 das Ronettes: Be My Baby. Sim, Psychocandy prenunciou o sucesso de Be My Baby que viria na trilha do longa Dirty Dancing em 1987. O resto do álbum deles tem toques de Bacharach, sempre combinados com muita distorção. É como se o Shibuya-kei fosse guitarreiro e mais barulhento, menos eletrônico. Esse paradigma duraria até os anos 2000 entre as bandas de rock indie, que emulavam essa "fofura distorcida".

Melodia carismática & a onda mais doce da new wave: Since Yesterday

Uma das minhas músicas pop preferidas EVER, Since Yesterday não ficaria deslocada ao lado num disco de Merrilee Rush, de France Gall ou de Petula Clark. Ela RESPIRA anos 1960. O maior sucesso da dupla Strawberry Switchblade saiu em 1984 e é sobre… guerra nuclear. Quenda. Existe um motivo para ela ser tão docinha mesmo com as batidas da new wave: o Strawberry Switchblade na sua origem era uma banda folk-pop, e essa música foi o marco da virada, composta por uma das integrantes, a Rose McDowall, mas produzida de maneira diferente. A melodia do começo foi tirada do terceiro movimento da quinta sinfonia de Jean Sibelius – não acredito que acabei de falar de música clássica nesse blog.

O clipe acima também mostra o estilo característico delas, com maquiagem pesadona nos olhos e muita estampa de bolinha, muito acessório, uma coisa fofa-moderna pra época. Precursoras do kawaii. Adoro demais.

Um momento, maestro: Everything But the Girl em 1986

Eu sei, tudo é sempre uma desculpa para falar de Everything But the Girl e Pizzicato Five, mas eu não resisti.

Em 1986, o Everything But the Girl já tinha lançado dois álbuns: Eden, que é bem jazzy bossa nova, e Love Not Money, super new wave rockeirita. Aí eles cometeram Baby, the Stars Shine Bright, a coisa mais retrô que eles poderiam fazer na época.

Acho que eles chegam até a ultrapassar os anos 1960 e chegam nos anos 1950, com arranjos grandiosos orquestrados, uma loucura. A versão deluxe lançada em 2012 inclui um segundo disco que traz demos e outras delícias tipo a versão deles de Alfie, música de Bacharach e David, e Where's the Playground, Susie? de Jimmy Webb (com a voz de Ben Watts liderando, coisa que não acontecia com frequência). MUITO SESSENTA.
Alfie, da trilha do filme de 1966 estrelado por Michael Caine no papel do mulherengo Alfie, seria lançada por Dionne Warwick pela vontade dos compositores. Mas a Paramount preferia uma cantora inglesa. Chamou Sandie Shaw. Ela não quis. A escolhida acabou sendo Cilla Black, na época que ela ainda era agenciada por Brian Epstein. Foi gravada nos estúdios da Abbey Road – onde o EBTG gravou Baby, the Stars Shine Bright. E depois seria regravada por Warwick e Cher.

Depois desse álbum de 1986, o EBTG partiria para o… sophistipop. Sim.

Você quer? Don't You Want Me?

Ah, sim, tem o Human League.
O álbum Dare de 1981 foi um divisor de águas para eles, que começaram como uma banda de eletrônico experimental!

Tudo é MUITO new wave. Mas ouça Open Your Heart, por exemplo. A melodia num crescendo soa bem retrô, e se tivesse uma big band por trás, poderia facilmente ser um hit produzido por Spector. Ela saiu antes do disco, como single, e nessa época os singles do Human League ganhavam selos azul ou vermelho para diferenciar o “estilo musical". Segundo a Susan Ann Sulley, uma das vocalistas, o vermelho era para os posers, os Spandy (fãs de Spandau Ballet, portanto fãs de… SOPHISTIPOP, oh, sim). E o azul, que era o selo do Open Your Heart?
"Para fãs de ABBA", respondeu o líder da banda Phil Oakey para a New Music Express em 1981.

Não sei vocês mas eu sou fã de ABBA.

Bom, e aí saiu o single Don't You Want Me desse álbum, uma música que Oakey considerava uma filler, a faixa mais fraca do álbum, tanto que é a última. HAHAHAHAHAHAHA! Foi o executivo da Virgin Simon Draper que insistiu no lançamento que seria o quarto single desse disco (os outros três foram lançados antes do álbum em si sair). Oakey defende que Don't You Want Me virou um sucesso graças à MTV, que passava o clipe toda hora.

O dueto, o refrão chiclete, o "ôô-ôô", a relação meio Pigmaleão "criador x criatura" encharcada de feminismo quando o textão da mulher entra. É tudo deliciosamente pop sessentista. MAS o visual do clipe é outro, que estava em voga nos anos 1980: new romantic (olha o make de Oakey, que tudo!), bem filme noir portanto anos 1940… que era a década da moda dos anos 1980, mesmo!
Também adoro a metalinguística no roteiro do clipe. A direção é de Steve Barron, um mestre que também cometeu Billie Jean de Michael Jackson em 1983, Africa do Toto em 1982 e Take on Me do A-ha em 1985! Dá um play que vale a pena.

Outra coisa que Susan Ann Sulley e Joanne Catherall, a outra vocalista, fariam pela cultura pop seria o visual retrô delas, construído em brechó. Por falta de grana? Também, mas a sensibilidade fashion delas gritava. Claro que elas não foram as pioneiras: já se fazia isso na cena jovem moderna do Reino Unido em geral. Mas elas divulgaram isso pelo mundo. Via MTV.

A ponte de tudo? Our Lips Are Sealed!

Jane Wiedlin e Terry Hall uniram forças em algum momento de 1980. Quer dizer… uniram os lábios mesmo. Wiedlin diz que eles tiveram uma coisinha rápida na turnê dos The Specials (de Hall) que a The Go-Go's (de Wiedlin) abria nos EUA. Era um caso secreto, pois Hall tinha uma namorada na Inglaterra. Nesse meio tempo, eles compuseram Our Lips Are Sealed, que acabaria saindo em 1981 no disco Beauty and the Beast das Go-Go's.

Enquanto banda de rock de mulheres, o The Go-Go's mantinha fortes laços com os anos 1960. Até demais: elas eram mais clássicas, e apesar de serem consideradas new wave (mais especificamente o começo da new wave, com esse disco Beauty and the Beast), para os meus ouvidos a coisa ainda está bem perto dos poucos acordes do punk e do ska, longe dos teclados e sintetizadores.

Só que Our Lips Are Sealed é muita perfeição pop sessentista. E aí apareceu a regravação de Hall, que já tinha saído do Specials, no trio Fun Boy Three. Esse foi o último hit deles, aliás, em 1983.

A música ficou mais dramática, combina uma certa ingenuidade sessentista com algo mais… O que a deixa, sim, muito mais Shibuya-kei, certo?

Claro que o Shibuya-kei RAIZ em si se aproveita dos avanços da eletrônica na música, e isso caracteriza demais o estilo, com samples e tal. O que eu quis mostrar é que tudo foi uma construção, que essa onda retrô já existia e que a revalorização do climinha lounge music não pintou do nada. Uma coisa que falta em tudo isso que citei e que o Shibuya-kei acrescentou com força no menu é a bossa nova.
Bom, se a gente for contar o Everything But the Girl… OH, WELL. Chega por hoje, vai.

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July 22, 2020 /Jorge Wakabara
Shibuya-kei, anos 1990, retrô, Burt Bacharach, Phil Spector, Serge Gainsbourg, The Beach Boys, retrofuturismo, wall of sound, anos 1980, anos 1960, Reino Unido, Inglaterra, Pet Shop Boys, Dusty Springfield, soul, Stephen Woolley, caso Profumo, Rupert Hine, Jeanette Obstoj, Paul O'Duffy, Swing Out Sister, Corinne Drewery, Andy Connell, Martin Jackson, Barbara Acklin, jazz, pop, sophistipop, Sandie Shaw, The Smiths, Neil Tennant, Chris Lowe, Morrissey, Johnny Marr, George O'Mara, Jim French, Stephen Street, Jim Reid, Willian Reid, The Jesus and Mary Chain, The Waterboys, Patti Smith, Hal David, Naked Eyes, The Ronettes, Strawberry Switchblade, new wave, Rose McDowall, Jean Sibelius, kawaii, Human League, Jimmy Webb, Everything But the Girl, bossa nova, Tracey Thorn, Ben Watts, Dionne Warwick, Cilla Black, Abbey Road, Susan Ann Sulley, Phil Oakey, Simon Draper, MTV, New Romantic, metalinguística, Steve Barron, Joanne Catherall, brechó, Jane Wiedlin, Terry Hall, The Specials, The Go-Go's, Fun Boy Three, lounge music
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Enquanto o mainstream saboreava o Tutti Frutti: uma loucura chamada Persona

July 21, 2020 by Jorge Wakabara in música, arte, livro

Fico apavorado só de ver a imagem!

Em junho de 1975, acontecia uma marco na história da música pop nacional: chegava às lojas o álbum Fruto Proibido, o clássico de Rita Lee & Tutti Frutti. Estavam lá Ovelha Negra, Agora Só Falta Você, Dançar pra não Dançar e outros hits do repertório de Rita.

O embrião da Tutti Frutti foi o Coqueiro Verde, uma banda da Pompéia dessas que tocavam em pequenas casas noturnas, e que mudou seu nome para Lisergia já em 1972. Faziam parte o guitarrista Luis Carlini, o baixista Lee Marcucci e o baterista Emilson Colantonio. O power trio cruzou o caminho de Rita Lee, que precisava de uma banda depois da sua dupla acústica Cilibrinas do Éden com Lucia Turnbull ter flopado. Eles todos "juntaram os trapinhos” e formaram a Tutti Frutti.

A banda passou por várias formações. A de Fruto Proibido já não tinha mais Colantonio nem Turnbull: trazia Franklin Paolilo na bateria, Guilherme Bueno no piano e Rubens e Gilberto Nardo no backing vocal.
No meio do ano seguinte, 1976, apareceria um novo álbum de Rita com a banda: Entradas e Bandeiras. Mas nesse intervalo… algo aconteceu. Em dezembro de 1975, Carlini gravava com Marcucci e Paolilo uma coisa um tanto, er, esquisita. Era Som.

Você já foi nesses troços barangos de fotografia com um jogo de espelho em que eles fundem sua imagem com a de um coleguinha mexendo na iluminação? Pois é: o princípio de Persona é esse (e desculpa, entendo como deve ter sido incrível nos anos 1970 mas eu acho barango). Persona é muito mais que uma banda: ele é um jogo desenvolvido por um artista plástico, Roberto Campadello, do qual Som é a trilha sonora.

O italiano Campadello mostrou uma semente disso pela primeira vez na Bienal Internacional de Artes de São Paulo de 1973 – era a Casa Dourada, um octógono desses espelhos especiais onde os visitantes se veriam fundidos uns nos outros com o artista distribuindo velas e convidando as pessoas a experimentarem coisas com suas imagens. O princípio não era exatamente novo – a Monga, por exemplo, se transforma em macaco assim – mas acho que o inovador eram as propostas e reflexões mais profundas de Campadello, uma coisa bem hippie de "você se fundindo nos outros” e por aí vai. Foi na Casa Dourada que o artista conheceu Carmem Flores: se apaixonam, se casam (dentro da Casa Dourada!!) e é a voz dela que canta no disco Som que acompanha o Persona.

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Na Bienal seguinte, Campadello já apresenta o jogo Persona em si, que foi lançado pela Grow junto com a trilha sonora. Também abre o bar Persona no Bixiga, com um porão onde as pessoas podiam experimentar o espelho especial. Por algum motivo, não existem muitas unidades do jogo por aí (era caro? pouca gente quis comprar? o próprio Campadello não gostou do resultado ou queria ganhar mais?). Tem quem defenda que o Som do Persona é um dos discos mais raros DO MUNDO!

E o que era esse jogo? Bom, você pode tentar ler as instruções, que incluem propostas de uso do espelho especial: tem desde copiar um desenho em uma folha em branco até brincadeiras eróticas com um parceiro (!) e o uso profissional em sessão de psicodrama! Vixe!!!

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Para me deixar ainda mais doido e obcecado: acho que já tive um livro do Roberto Campadello. É que ele entrou numas de I Ching e lançou isso aqui:

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Se não me falha a memória, na minha fase CRIANÇA ESOTÉRICA eu jogava I Ching e um dos livros que eu tinha era esse, com outro de capa preta.

Quanto ao Carlini: ele abandonaria o barco de Rita depois que Roberto de Carvalho entrou e começou a sedimentar uma parceria com a cantora que renderia uma sequência eletrizante de hits. Só que Carlini registrou o nome da Tutti Frutti, então levou o nome com ele! Chegaria a lançar um disco da Tutti Frutti sem Rita, só que o lançamento demorou, perdeu o timing e acabou flopando. Era o Você Sabe Qual é o Melhor Remédio de 1980. Da formação original, só Carlini continuava.

Antes disso, Tutti Frutti ainda cometeria uma pérola com Rita – na minha humilde opinião, um disco tão bom quanto Fruto Proibido apesar de menos celebrado. Era Babilônia, de 1978, que já trazia Carvalho com teclados e guitarra e assinando arranjos. Uma das músicas era composição da dupla Rita & Roberto: Disco Voador.

Babilônia é a ponte entre Rita roqueira e Rita pop: tem Que Loucura, rockão assinado só por Carlini (que, aliás, também está no álbum do Tutti Frutti de 1980), tem a parceria entre Rita e Carlini Sem Cerimônia (que eu AMO, rock-melô das atrevidas), tem três parcerias de Rita e Marcucci (Miss Brasil 2000 e Jardins da Babilônia, rocks da melhor qualidade, e Agora É Moda, pop dançante chique demais) e músicas compostas apenas por Rita (O Futuro me Absolve, baita pop brasileirérrimo; Eu e Meu Gato, baladão de duplo sentido brincando com gato-bicho e gato-boy; e Modinha, filosófica, muito simpática e bem Rita Lee).

É isso. Ouçam e celebrem Babilônia.
E Tutti Frutti também – é legal, sim!

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July 21, 2020 /Jorge Wakabara
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